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Didi Wagner

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Trip FM

Didi Wagner

Didi Wagner

Didi Wagner é uma das mais belas, charmosas, simpáticas e bem-humoradas apresentadoras da televisão brasileira. Paulistana, ela começou sua carreira como modelo, até que em 1999 foi contratada pela MTV, onde trabalhou por seis anos apresentando os mais variados programas. Em 2006 estreou no canal Multishow o Lugar (In)Comum, um programa muito bacana que atualmente revela o lado B dos mais variados destinos turísticos do mundo.

O papo desta semana aqui no Trip FM é com a mãe da Laura, da Luísa e da Júlia, a Adriana Golombek Wagner, mais conhecida como Didi Wagner, que foi capa da edição de março da Tpm com uma entrevista muito bacana que faz parte do especial sobre casamento da revista.

O Trip FM vai ao ar na grande São Paulo às sextas às 20h, com reprise às terças às 23h pela Rádio Eldorado Brasil 3000, 107,3MHz


José de Abreu

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La Revolución, para ele, é acima de tudo individual. Policial, preso político, hippie sujo e, mais recentemente, militante virtual e (pseudo) bissexual. Zé de Abreu, o vilão Nilo, de Avenida Brasil, já foi um monte de coisa. E agora, José? “Tô pensando em virar deputado”

Demorou 48 horas, oito cervejas (baratas) e dois tintos portugueses (Esteva Douro 2010, R$ 130 a garrafa) para José de Abreu, o ator global, contar que José de Abreu, o seminarista, foi abusado por um padre aos 12 anos. Que José de Abreu, o policial, aprendeu a fumar maconha com os colegas da corporação. Que José de Abreu, o militante político, ficou amigo do xará José Dirceu na faculdade e apoiou a luta armada contra a ditadura. Que José de Abreu, o hippie fritado de ácido, bordou cogumelos na calça olhando o mar da Bahia. Que José de Abreu, recém-saído do armário no Twitter, na real nunca pegou homem – se assumiu bissexual “apenas para experimentar como é ser minoria”. Que José de Abreu, pai de cinco e avô de quatro, não ligou de tirar as calças na sessão de fotos para esta entrevista (mas lamentou estar de cueca branca “fraldão”; a do dia anterior “era mais bonitinha”). E isso é só o começo.

Numa tarde de segunda-feira, Trip visitou o ator em seu apartamento de frente para a praia da Barra da Tijuca, que ele até hoje financia pela Caixa Econômica Federal (“gasto tudo que ganho, não sei juntar”). De regata branca, relógio Calvin Klein, bermuda azul e chinelo preto, ele atende já pedindo desculpas pelo mascote da casa, um lhasa apso chamado Pipo que não para de latir um segundo. “Parece deputado em campanha”, brinca Zé (pode ser só Zé mesmo).

E, de política, embora diga que não entenda, ele fala sem parar. Naquele mesmo dia, tinha voltado da Bahia, onde fora apresentado a Duda Mendonça, marqueteiro de Lula em 2002, por um amigo em comum: o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, condenado a dez anos e dez meses de prisão no julgamento do mensalão (Zé defende sua inocência). Mendonça mandou um helicóptero para levar o mais novo compadre até sua mansão em Taipus de Fora. O papo do trio começou na Skol e terminou com cervejas belgas. O cão que ladra no Twitter agora quer morder: Zé anda pedindo conselhos para os próximos, pois está na dúvida se encara uma candidatura à Câmara dos Deputados em 2014. “Ninguém é a favor”, diz.

Por ora, é nas redes sociais que ele faz política. Em um mesmo dia, descasca o pastor evangélico Marco Feliciano (PSC-SP), eleito presidente da Comissão de Direitos Humanos, o novo papa, Francisco, o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) e o ex-presidenciável tucano José Serra. Rato de passeata na época da ditadura (“eu era porra-louca, ficava bem na frente dos protestos”), ele considera o novo ativismo, o das redes sociais – nas quais por sinal gasta várias horas do dia –, coisa de “militante lobinho”. “Eu acho que está na hora da molecada tirar a bunda da poltrona.”

Penny Laaaaaaaaaaane is in my ears and in my eyes...

A música dos Beatles ecoa como toque do iPhone 5 de Zé, um viciado confesso em tecnologia, que tem a coleção inteira da Apple e chegou a ser apelidado pelo colega José Mayer de Zé Windows nos anos 90 (para ter acesso à internet, na pré-história da era virtual, descolou uma senha do Ministério das Comunicações).

Antes de interpretar Nilo, o vilão de Avenida Brasil que conquistou brasileiros de todas as idades, José Pereira Abreu Júnior foi muita coisa. Nasceu em Santa Rita do Passa Quatro há 66 anos, onde viveu o clichê do interior paulista – falava “porrrta” e arrumava namoradinhas fazendo o footing na praça.

 

Para ele, o novo ativismo, baseado nas redes sociais, é coisa de “militante escoteiro”

 

O pai, delegado da cidade, era querido por todos. Mas morreu cedo, quando Zé Júnior, o caçula, tinha 9 anos. Ele, a mãe e as duas irmãs passaram sufoco. Cinco anos depois, estavam todos em São Paulo, onde Zé demorou para se sentir bem (de cara foi apelidado de Caipira). A casa dos Abreu, no bairro de Santa Cecília, chegou a virar uma pensão até a situação financeira se acomodar. Logo o destino ricocheteou, tal qual máquina de pinball, e fez com que o filho de delegado entrasse para o setor de entorpecentes da polícia, no qual apreendia drogas de moleques da mesma idade que ele. Sua função era enturmar-se com a galera e provocar o flagrante. Zé, que nunca tinha provado da erva, teve de aprender a tragar. Virou fã.

Já ex-policial, passou em direito no vestibular. Entrou na PUC de São Paulo em 1967 e, na faculdade (que não chegou a terminar), conheceu o presidente do centro acadêmico, José Dirceu, que naquela época também atendia por “Alain Delon das massas”. “Ele sempre foi para um lado mais político e eu, mais artístico. Não chegou a fazer teatro, embora fosse um puta de um artista. Discursando em cima de um caminhão, ele era um monstro”, compara.

Zé nunca tinha visto uma peça até então, mas acabou virando produtor do Tuca, o teatro da PUC. Substituindo um colega em um ensaio, sacaram que ele levava jeito para a interpretação. Antes de ser ator, porém, outro aposto se somaria ao seu nome: o de preso político. Zé era um dos 700 estudantes que rodaram no congresso de 1968 da UNE (União Nacional dos Estudantes).

Após dois meses no xadrez, viraria vendedor de máquinas de escrever, funcionário da IBM, dono de livraria e autoexilado na Europa. De volta ao Brasil, lá pelo fim da década de 70, tornou-se ator de vez. Seu papel no filme A intrusa (1979) rendeu-lhe um convite para a TV. Assinou contrato com a Globo em 1º de outubro de 1980. Conta 30 anos e 15 novelas como empregado da família Marinho, fora três anos na já extinta Rede Manchete. No momento, está fora das telinhas. Mas está nas telonas, no filme Meu pé de laranja lima, e na peça Bonifácio Bilhões (“ela fala sobre ética”), em cartaz em São Paulo até 30 de junho.

 

Enquanto narra suas experiências lisérgicas, dá garfadas em um ossobuco de R$ 86

 

Com mais plim-plim que reclames, namorou colegas como Mônica Martelli e Luisa Thiré e casou e descasou com Nara Keiserman e Neuza Serroni, até conhecer o “grande AMOR” (assim escreve num e-mail), dez anos atrás. Camila Mosquella tinha 21 anos na época.

Enquanto o marido narra suas experiências lisérgicas e dá garfadas em um ossobuco de vitela de R$ 86 (prato mais gorduroso, no preço e nas calorias, do cardápio), ela desliza o dedo no iPad e curte fotos no Facebook. À repórter, pediu dicas de compras na rua Oscar Freire, meca do consumo de luxo paulistano. O filho Theo, 36 anos, que já foi o Menino Maluquinho no teatro e hoje é advogado do ramo imobiliário, junta-se ao grupo.

Estamos no Gero, restaurante italiano de alta gastronomia, onde Zé costuma ir “quase toda semana”. Não vê contradição em ser de esquerda e gastar R$ 1 mil em um jantar para cinco pessoas. “O que eu deveria fazer? Doar meu salário da Globo?”, retruca. Foi, talvez, sua única esquivada durante a entrevista. “Vou contar para vocês tudo que nunca contei antes.”

Esse bronze é da Bahia?
Pois é, fui conversar com o Duda Mendonça. Cara sensacional. A relação dele com os empregados é de emocionar.

Falaram sobre o quê?
Fui pedir conselho. Falei dessa loucura de o Lindbergh [Farias, senador do PT-RJ] querer me lançar como candidato a deputado federal. Fui conversar sem compromisso, tomar uma cervejinha.

E ele apoiou sua candidatura?
Não. Nenhum cara bom de cabeça dá força [risos]. A família não quer nem pensar. Fui conversar com o Lula, e ele me falou a mesma coisa. O Zé Dirceu, muito meu amigo, também.

Que bandeiras você defenderia, caso eleito?
As principais bandeiras da esquerda. Melhoria no serviços de saúde, combate à miséria, aplicação de mais dinheiro na educação, descriminalização do aborto e das drogas leves.

Mas você não acha que dá para fazer política sem ser político?
Acho, é o que faço o tempo inteiro.

Mas agora você quer ser político.
Não sei se quero, não. Além da oposição da família e dos amigos, tem o bolso, que vai doer. Ganho muito mais na Globo. Teria que pedir suspensão do contrato.

Você já teve algum problema na Globo por causa de seu posicionamento político?
O Projac é um mundo à parte. Passa um carrinho com alguém vestido com roupas da década de 30, depois outro em cima de um cavalo... Não tem ligação nenhuma com a realidade brasileira. E a maioria dos artistas é de esquerda.

Você divulga seu salário?
Não.

Por quê?
Acho chato. Vai ter colega rindo da minha cara porque ganho pouco e colega puto porque ganho muito.

Com o salário de deputado ficaria difícil viver?
Um deputado ganha R$ 12 mil por mês. É muito pouco para o nível de vida que eu levo. O meu apartamento, por exemplo...

É seu?
É. Primeira vez que tenho casa própria. Acho uma bobagem, coisa de brasileiro. Morei em 12 bairros do Rio em 32 anos.

 

“O Projac é um mundo à parte. Não tem ligação nenhuma com a realidade brasileira”


E você frequenta a praia?
Nunca. Sou paulista, meu [risos]. Vou de vez em quando ali no Pepê, tem sempre uns amigos jogando futevôlei. Mas sou totalmente...

Sedentário?
Total! Li sobre dois tipos de gente: o ateniense e o espartano. Sou totalmente ateniense. No meu tempo, o pior do vôlei passava num corredor polonês. Eu apanhava todos os dias. A única coisa em que me dei bem foi natação, um esporte solitário. Bola é pra mim um negócio impossível de dominar.

Mas devia fazer sucesso com as meninas...
Era baixinho, feio e queixudo. Mas usava um topete, tinha uma chinfra. E dançava muito bem rock, twist, hali-gali, essas coisas. Minhas melhores amigas acabavam virando namoradas.

A primeira foi com quantos anos?
Foi a Uda, lá em Santa Rita. Ela me mandou um correio do amor: “José Júnior, eu te amo. Ass.: Uda”. O nome dela de verdade era horrível: Euricilda. Eu tinha uns 8 anos.

Você perdeu a virgindade com ela?
Não. Foi anos mais tarde, com uma vizinha de um amigo. Uma negra maravilhosa que me levou aos céus.

Como foi a sua criação?
Meu avô era fazendeiro. Meu pai era delegado da polícia, respeitado e querido por todos. Dizia: “Você está preso! Vai para a cadeia que daqui a pouco vou lá te trancar”. Todo mundo respeitava. Morreu cedo, quando eu tinha 9 anos. Ele nunca bebeu, era grilado com o fígado. Mas acabou morrendo de remédio para cirrose hepática, uma doença de bêbado. Ele e minha mãe eram bem carolas. Fui coroinha. Tinha a roupa, o padre falando latim, os incensos, o órgão... Era um ritual lindo.

Parecido com teatro, não?
Totalmente!

 

“Minha mãe me arranjou um trabalho na polícia. Deu merda. Aprendi a fumar maconha”


Sobrou algo do latim?
Sobrou. [Zé recita pai-nosso e ave-maria inteiros em latim.]

Você frequentou a igreja até quando?
Cheguei a ser seminarista. Assim que meu pai morreu, ficamos bem duros. Ele tinha um salário excelente, mas minha mãe não sabia nem o banco em que ele tinha conta. Os padres batiam na porta das casas e recrutavam crianças. Minha mãe achou bom eu ir. Acordava às 5h30 e tomava banho frio, de roupa e tudo, porque ninguém podia ficar pelado na frente do outro. Era uma repressão filha da puta, você tinha que se trocar embaixo do lençol.

Tinha algum padre pervertido?
Tava cheio.

Você presenciou alguma coisa?
Vivi. Um dia, um padre me deu uma masturbadinha leve. Fiquei muito grilado porque não sabia como confessar. Tinha 12 anos. Lembro do filme até: Marcelino Pan y Vino. A gente estava assistindo, e o cara pegou no meu pau. Foi um susto. Tirei a mão dele, levantei, mas fiquei com aquele pecado na cabeça.

Mas confessou, finalmente?
Não. Fiquei um ano no seminário, depois voltei pra Santa Rita. Todo mundo me chamava de padre, era horrível. Como minhas irmãs já moravam em São Paulo, minha mãe resolveu mudar-se também. Foi um choque. Meu apelido virou Caipira.

A mudança para a cidade grande foi traumática então...
Foi, mas depois melhorou. Fiz uns amigos na Santa Cecília, bairro onde morava. A gente já bebia bem. Cuba libre, hi-fi... Havia uma coisa de turma, influenciada pelos filmes do James Dean, da época. Nem tinha maconha. Só bolinha, anfetamina. Pervitin era o nome.

O que sua mãe achava disso?
Morria de preocupação. Ela era conservadora. Pegava negrinhas em orfanato para “criar”. Tive uma babá, a Sebastiana, que tinha que correr atrás de mim enquanto eu andava de bicicleta. Um absurdo... Mas, enfim. Minha mãe me arranjou um trabalho na polícia. E aí que deu merda. Aprendi a fumar maconha [risos].

Aprendeu a fumar maconha na polícia?
Explica isso. Me colocaram no setor de entorpecentes. O delegado disse: “Você vai dar flagrante. Sabe fumar maconha?”. Eu disse que não. “Dá uns baseados pro Zé, ensina como fuma essa merda.” Acenderam o beck, ligaram a sirene e falaram: “Segura!”. Comecei a rir pra caralho. Descobri que meus colegas fumavam o tempo inteiro. Era a primeira coisa que faziam antes de sair para a ronda.

Vocês iam chapados prender gente fumando maconha.
Exatamente.

Não dava crise de consciência?
Imagina, era uma aventura! Estava brincando de bangue-bangue.

A carreira na polícia durou até quando?
Foram quase três anos. Um dia, me fizeram ver um cara ser torturado. O cara se cagava, se mijava todo. Vomitei. Pedi pra sair. Fui pra Santa Rita, me enfiei na fazenda de um amigo meu. Abandono de cargo. No fim, minha mãe falsificou minha assinatura e fez um pedido de desligamento da polícia. Foi nessa fazenda que resolvi fazer direito. Do nada.

Como foi na faculdade?
Foi quando me politizei, comecei a fazer teatro e política. A única coisa que não fazia era ir pra aula. Eram anos difíceis, uma ditadura ferrenha. Mas, ao mesmo tempo, a universidade fervia, você sabia que tinha companheiros ali. A própria universidade te protegia. Era muito gostoso passar o dia lá.

Qual foi a primeira causa que você abraçou?
O pessoal do CA [Centro Acadêmico] começou a se unir com os excedentes pra pressionar a faculdade a aumentar o número de vagas. Às vezes passavam 400 pessoas e tinha vaga pra 60. Tinha acampamento em todas as faculdades de São Paulo. Começaram a usar o artigo 477 [proibindo fazer política na faculdade] pra expulsar alunos. Caralho, os estudantes tinham que fazer política! Era inimaginável o cara estudar filosofia, direito ou ciências sociais e não fazer política.

Foi quando você ficou amigo do José Dirceu?
Isso, logo que entrei. Ele era presidente do CA e ia de sala em sala fazer um proselitismo político.

O que pensa da condenação de Dirceu e do julgamento do mensalão?
No fim, não há prova nenhuma. Tiveram que usar essa história do domínio do fato [teoria de que o autor não precisa ter executado o crime, basta ter domínio sobre o que seus subordinados fazem]. Processo totalmente viciado. Pra mim, caixa dois, o caceta, o PT fez. Foi ingênuo. Usou uma coisa que já tinha sido usada pelo PSDB.

 

"Hoje se faz ativismo no ar-condicionado, clicando no mouse. É leve, quase uma brincadeira"

 

Qual era o seu papel no movimento estudantil?
Eu era o porra-louca. O cara que ficava na comissão de frente, que pensava na logística das manifestações, no roteiro etc.

E da luta armada, participou?
Apenas dando apoio logístico. Não me via dando tiro em guardinha. Você acha que eu vou atirar em alguém? Menor possibilidade, ia me cagar todo, deixar o cara me matar. E eu sabia que o guardinha não tinha nada a ver com a ditadura.

Você foi um dos 700 jovens presos no Congresso da UNE, em Ibiúna. Como foi?
A gente soube com antecedência que os policiais estavam vindo. Mas, por causa de uma discussão interna, não conseguimos resolver se tentávamos escapar ou se ficávamos. Acabamos ficando. Foi engraçado aquele bando de adolescentes cabeludos indo preso. Os policiais não sabiam o que fazer, liberaram vários deles no caminho de volta para São Paulo.

Mas você foi preso, não foi?
Fui, assim como todos os líderes. Fiquei dois meses na prisão.

E depois?
Fiquei dois anos em São Paulo, como dono de livraria, saindo pouquíssimo. Peguei um advogado muito bom, queria voltar à vida normal.

Mas largou o movimento?
Não, continuei fazendo alguns serviços. Dava caronas para o pessoal da luta armada, fazia entregas.

Qual a diferença do ativismo dessa época com o praticado atualmente, das redes sociais?
Não tem nenhuma comparação. Não tem como explicar a ditadura pra quem nunca viveu ela. Ser ativista era uma obrigação moral de qualquer ser humano que se prezasse. Hoje se faz ativismo com toda a liberdade do mundo. Dá pra fazer no ar-condicionado, clicando no mouse. É um ativismo leve, quase uma brincadeira. Mesmo que fale de assuntos sérios de vez em quando.

Mas você não acha que o ativismo virtual pode gerar resultados reais?
Acho. O Egito foi um exemplo. A Espanha também. Aqui no Brasil, por enquanto, ainda não vi nada que tenha funcionado de fato. Não basta 3 mil pessoas falarem “vamos” no Facebook e acabarem não indo. Fora que as causas são mal escolhidas. Marcha contra a corrupção?! É a mesma coisa que dizer que você é contra a morte. Todo mundo é!

 

“Na internet você fala coisas que no boteco, bêbado feito uma vaca, você não fala porque é crime”


As causas de hoje são bobas?
Tem uns protestos ridículos. Mas, como é fácil, basta um clique no mouse, um monte de gente apoia. O duro é você sair, pegar um metrô, uma bicicleta, ir lá no Masp e gritar. E outra: um militante virtual é sempre uma persona, nunca é você mesmo. O avatar é um lado que você mostra, não é necessariamente você. Na internet você fala coisas que no boteco, bêbado feito uma vaca, você não fala, porque é crime de morte.

Mas você é bem militante na internet. O que o faria ir para a rua protestar hoje?
Sei lá, muito difícil eu sair de casa. É o único lugar que acho que não tem ninguém me filmando, me patrulhando.

E o que fez você se afastar do movimento quando jovem?
Eu tinha filho já. Comecei a sentir uma outra inquietação, mais estética e artística do que política. Minha coisa era com a maconha, com a literatura beatnik, o movimento hippie. Tinha acontecido o Woodstock, Vietnã. Depois teve maio de 1968 na França, “É proibido proibir”, Caetano Veloso cantando aquelas coisas. A Neusa [primeira esposa] vaiava, e eu aplaudia.

Por que a Neusa vaiava?
Porque não entendia aquilo, assim como 80% das pessoas. No dia seguinte, na faculdade, estava todo mundo arrependido. Tive sorte de ter um pé nas duas canoas. Participei das duas revoluções da minha geração: a política e a artística. A coisa dos Beatles falando da Índia, essa história de usar roupa colorida e desbotada, lenço na cabeça, sentar no chão... Isso mudou o comportamento do ser humano, cara. Hoje o homem pode usar a roupa que quiser, a cor que quiser. Eu cheguei a ser chamado de veado porque estava com uma blusa vermelha com gola V, porra. Isso tudo foi uma revolução. E, claro, tinha o ácido.

Quando foi o primeiro?
Foi na Bienal de São Paulo, em 1971. Minha turma da Santa Cecília, aqueles malucos que tomavam remedinho pra não dormir, viraram artistas plásticos. E me apresentaram para um artista gringo que veio fazer uma instalação. Ele tinha uma porrada de ácido. Tomei e foi: “Caraaaalho! É isso!”. Make love, not war. Entendi tudo.

Foi a primeira de várias trips?
Foi. Mas era uma coisa responsável. Eu era intelectual, né? Então fui lá, comecei a estudar um monte sobre peiote, mescalina, LSD. Depois me separei [da Neusa]. Fui parar na Bahia, em Arembepe. Lá era o Woodstock brasileiro. Até a Janis Joplin, dizem, foi. Namorei a Renata Souza nessa época, uma milionária paulistana que tinha sido a primeira a usar um biquíni em São Paulo. Já tinha tomado uns 200 ácidos! A gente classificava as pessoas assim [risos]. Quando voltei pra cidade, nos separamos. E me apresentaram à Nara [sua segunda mulher]. Tomamos um ácido juntos e nos apaixonamos. Ficamos casados 19 anos e tivemos três filhos, que nos deram quatro netos. Pra você ver: às vezes a droga une. Meu analista sempre falava: “Droga não muda ninguém, só reflete e potencializa o que você já é”.

 

“Tomei ácido pela primeira vez e foi: ‘Caraaaalho! É isso!’. Make love, not war. Entendi tudo”


Toma ácido ainda?
Não! Não se faz mais ácido como antigamente. Porra, hoje os caras tomam pra ir pra balada! A última vez que tomei foi no Egito, dentro de uma pirâmide.

E o autoexílio?
Quando me apaixonei pela Nara, não queria mais saber do Brasil. Pegamos um navio italiano e fomos à Europa. Londres primeiro.

O Caetano Veloso ainda estava lá nessa época?
Sei lá. O Caetano era mainstream demais pra mim. Moramos em uma comunidade em Shepherd’s Bush, um bairro de negros, barato. Moravam 11 brasileiros e um inglês. O síndico era africano. Não lembro de que país, mas financiava as rebeliões em seu país. Vendia maconha pra comprar fuzil. E a gente ajudava, gritava em Portobello Road: “Compre maconha e ajude a África!”.

Quanto tempo em Londres?
Quatro meses. Eu lavava prato e a Nara era garçonete. Fazia cinco pounds por semana, mas era rico. Um pound para morar na comunidade, mais dois pounds de comida. Só. Eu chegava às 11 horas no restaurante, fazia um puta café da manhã, lavava pratos até as 15 horas e depois comia só à noite. Aí fingia ser macrobiótico, que nem o resto da galera. Meu filho foi comer carne só com 7 anos de idade.

Você morou em Amsterdã também, certo?
Nossa comunidade resolveu fazer um grupo de música e ir pra lá. Quem deu a ideia foi o Carlinhos, um cara de Niterói muito louco, que mais tarde seria o primeiro a exportar ginseng para o Brasil. Ele disse: “Temos que fazer uma vibração místico-cultural-musical sobre Atlântida”. Montamos o Children of Moo. Eu tocava flauta doce, a Nara, piano. A gente escolhia um tema, cada um pegava sua lasquinha [de ácido] e pronto. Depois resolvemos comprar uma Kombi e ir para a Índia, que era o que estava pegando na época. Todo mundo foi desistindo no caminho. Eu e a Nara ficamos na Grécia. Tava bom demais, não conseguimos ir embora. De lá voltamos para o Brasil, quando o pai da Nara mandou um telegrama avisando que tinha um emprego pra gente na Universidade Federal de Pelotas, como professores de teatro. Salário, funcionário público, tudo certinho.

Vocês tinham uma relação aberta?
Não, não! Sempre fui casado, então não tinha amor livre. Só no final do casamento, mas foi só uma maneira de dar uma sobrevida. Ela me dava carta branca mais do eu que dava a ela!

É possessivo, Zé?
Claro, sou um macho brasileiro normal, nascido em 1946. Mas tento lutar contra isso. Nunca casei com uma mulher machista. Sempre casei com mulheres fortes, feministas, que botavam o pau na mesa. E obviamente isso me ajuda muito a erradicar o meu machismo. Mas confesso: tenho preconceitos, apesar de lutar todos os dias contra eles. Me cuido, quero fazer o bem pras pessoas e procuro fazer o possível para não ser injusto, indelicado. Tento vibrar positivamente, sabe?

 

“Como não posso ser mulher, negro ou gay, escolhi ser bissexual. Foi um gesto político”


Mas que preconceitos acha que tem?
Nunca tive um ato racista contra um negro. Mas já ri de piada racista, já repeti piada racista, até pra amigo negro. Já tive uma namorada negra, amigos. A proporção de negros na minha vida foi mais ou menos como é na vida de todo mundo, como é numa novela da Globo.

No começo do ano você declarou no Twitter que era bissexual. Por quê?
Porque comecei a ver um monte de queixa no Twitter de mulher agredida, gay espancado, negro escorraçado. Me deu uma loucura: quero saber como é se sentir minoria, ser vítima de preconceito. Como não posso ser mulher, nem negro, nem gay, pois sou casado com uma mulher e já fui casado com outras, escolhi ser bissexual. Foi um gesto político.

Você então nunca se relacionou com um homem?
Estou casado com a minha mulher há quase dez anos. E estou bem. Não estou aberto a outra relação. O fato de eu ter tido ou não relações bissexuais não importa. O fato de eu ter falado que era já me colocou essa pecha. Virei bissexual e fim de papo. Apanhei, mas valeu a pena. Foi um teste sociológico, uma pesquisa psicoantropológica.

Mas, Zé, teve ou não teve sexo com homem?
Olha, eu fiz duas peças que tinha beijo na boca. Mas era beijo técnico... [risos]. Era uma cena absolutamente poética, lindíssima. As mulheres choravam alto.

E fora do palco?
Fora do palco, não. Mas não foi por preconceito.

Você deve ter muitos colegas bissexuais que não se assumem.
Vários! E eles vieram me abraçar, me agradeceram [por dizer que era bissexual]. Recebi muitos e-mails de congratulações.

Por que atores não podem ainda assumir sua sexualidade?
O Marco Nanini acabou de declarar que é gay... Mas não sei. É uma questão muito de foro íntimo, talvez atrapalhe a carreira. Aliás, será que isso vai acontecer comigo?

Você está preocupado?
Eu não! É a primeira vez que eu penso nisso. Até agora fingi que sou macho, não foi? Vou continuar fingindo. Não tem problema nenhum.

E o vídeo que você gravou com o Rafinha Bastos, em que vocês são amantes?
Ele me ligou e eu topei na hora. Achava que já conhecia ele, mas confundia com aquele outro do CQC, o [Danilo] Gentili. Sempre que tinha evento, a Globo colocava eles atrás de uma grade lá longe, uma baita humilhação. Mas eu sempre ia lá falar com os caras. Rafinha foi lá em casa gravar, pegou uma ponte aérea só pra isso. Acho injusta a perseguição que fizeram com ele por causa daquela piada de que mulher feia deveria agradecer por ser estuprada. Estão levando o humor a sério demais.

Como é a vida sexual aos 66 anos?
Não muda nada. Nunca tomei nenhum aditivo desses. Acho que a minha geração está chegando aos 70 muito bem. Tem José Mayer, José Wilker, Paulo Betti, Antonio Fagundes, Tony Ramos.

Como e quando você conheceu a Camila?
Em um aniversário meu, que fiz na pousada de um amigo, em Teresópolis (RJ). A Camila era amiga de academia da esposa dele. Conversamos bastante e acabou acontecendo.

 

“Abrir mão do meu salário da Globo para poder ser de esquerda? Acho isso ridículo”


Foi depois de começar a fazer análise?
Comecei análise quando fiquei grávido do Bernardo [filho caçula], que hoje tem 12 anos. Resolvi fazer porque fazia muito tempo que eu não tinha filho. E a gente [ele e a mãe de Bernardo] não era casado. Nessa época, eu era garanhão. Um jornalista do Globo até me chamava de José “Casanova” de Abreu, porque eu só namorava mulheres bonitas. Tinha muita casa noturna no Rio, todo mundo ia pra rua.

E quais mulheres lindas você namorou?
A Mônica Martelli, a Flávia Zillo, a Luisa Thiré. Não são mulheres lindíssimas, mas são tipos incríveis. Mulherões, entendeu? Mulheres de impacto.

Você se dá bem com suas ex-mulheres?
Me dou bem com todas. Principalmente com a Nara. A Neusa mora em São Paulo, a gente praticamente não tem contato. Depois que o Rodrigo morreu [em 1992]... Aí que perdemos o vínculo mesmo.

Rodrigo, seu primogênito, morreu aos 21 anos. Você tem problema em falar sobre isso?
Nenhum. Durante muito tempo frequentei centro espírita, inclusive meu filho ia também. Me seguro nessa.

O que aconteceu exatamente?
Ele caiu da janela. Estava chuviscando, e tinha uma persiana. Ele sempre botava o corpo pra fora da janela, era muito grandão, atlético. Aí passou pelo buraco. Não havia possibilidade de suicídio, a gente tinha acabado de conversar. Ele tinha ido no banco, levado o jipe pra consertar, estava preparando o futuro. Foi comer mamão, ligou o rádio e caiu.

Como você encarou?
Eu estava fazendo Amazônia, na TV Manchete. Me deram 15 dias de férias. Depois, voltei a gravar.

Não é contraditório ser um cara de esquerda e ser global, comer no Gero e se hospedar no Fasano ao mesmo tempo?
Não sei, bicho. Perguntavam a mesma coisa para o Geraldo Vandré na época, porque ele tinha um Ford Galaxie. Ele respondia: “Não sou proletário. Não vou me fantasiar como tal”. Eu gasto grande parte do meu dinheiro com viagem, comida, bebida. Eu tenho que abrir mão do meu salário da Globo para poder ser de esquerda? Acho isso tão ridículo quanto achar que sou mau ator porque sou de esquerda. Tem jornalista que coloca isso na imprensa. Dizem que sou um ator coadjuvante... Porra, até a Fernanda Montenegro é coadjuvante de vez em quando! Não existe ator coadjuvante. E hoje vou ganhar um prêmio de melhor ator da APCA [Associação Paulista de Críticos de Arte], justamente por um papel coadjuvante. Que tal?

Márvio Lúcio, o Carioca

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Felipe Chiri/Trip FM

Carioca

Carioca

O papo de hoje é com Márvio Lúcio dos Santos Lourenço, o Carioca do Pânico, um dos mais importantes humoristas do Brasil e um verdadeiro mestre das técnicas de imitação. Natural de Niterói e criado em São Gonçalo, cidade que compõe a região metropolitana do Rio de Janeiro, ele estudou Jornalismo e, em 1996, conseguiu um estágio na rádio Jovem Pan.

Contou muita camiseta, colou muito adesivo em carro, gravou muita vinheta e, alguns meses depois, conseguiu a tão sonhada vaga no programa Pânico. Sua aptidão para a comédia, que vem da família, e seu talento nato para as imitações o transformaram na principal atração do programa, seja na pele de Amaury Dumbo, de Jô Suado, de Zeca Tamagro, ou em sua versão original, o Carioca.

Coração de estudante

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Nos anos 80, quando a ditadura já ia mal das pernas, uma galera xingou muito (e não foi no Twitter) para pressionar pelo fim do regime militar no Brasil. E lá estavam estes dois, esgoelando-se em comícios das Diretas Já, com discursos e decotes libertários, ou em Brasília, uma cria do marxismo-leninismo que metia dedos na cara para denunciar a “incubadeira de escândalos” no Congresso. 

A cantora Fafá de Belém e o presidente do Senado, Renan Calheiros, falam à Trip sobre seus tempos de ativista. “Se fosse naquele período eu estaria, sim, nestes protestos”, diz o senador, sobre os protestos que correm a internet pedindo o seu impeachment.

Musa das Diretas

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Fafá de Belém soltando a pomba da paz

Fafá de Belém soltando a pomba da paz

Fafá de Belém soltava a voz, a pomba e a franga nas Diretas Já. Chamava atenção com seus penteados, seus decotes, suas interpretações arrebatadoras do “Hino Nacional” nos comícios. Calcula ter subido em 47 palanques pelo país afora (“fui de jegue, de bicicleta, pagava passagem de avião”). Sua marca era liberar uma pomba branca, geralmente comprada do próprio bolso no Mercado de Pinheiros, no final dos atos políticos. Entre 1983, e 1984, ao se juntar às milhares de pessoas para pedir eleições diretas num Brasil com duas décadas de ditadura nas costas, virou a “musa das Diretas”.

O título foi coisa da cabeça do jornalista Augusto Nunes, conta Fafá três décadas depois, por telefone. E ela estava mesmo em todas. Segundo a cantora, o ex-presidente Lula, a ex-primeira dama Marisa, o deputado petista José Genoino e o cartunista Henfil (quem lhe sugeriu a ideia de soltar “as pombas da liberdade”) faziam parte da turma que se reuniu em seu apartamento na rua Haddock Lobo, nos Jardins, no dia 25 de janeiro de 1984. Caminharam juntos de lá até o grande ato da praça da Sé. “Naquela altura não tinha cachê, nada. Tinha uma causa. E os artistas eram uma ponte.”

A paraense cresceu “ouvindo o pau comendo em casa”, com as agitadas discussões políticas entre a família do pai (“anarquista”) e da mãe (filha de uma família de políticos poderosos na região). Tinha sete anos e morava em São Paulo quando os militares chegaram ao poder em 1964. “Vi as tropas tomarem a cidade. Morava na praça perto da Assembleia Legislativa e estava esperando um amigo do papai, comunista, atravessar o viaduto Maria Paula.”

No ano seguinte, a família se mudou de volta para Belém, “e a guerrilha do Araguaia era bem próxima de lá”. Com vinte e poucos anos, mais uma vez em São Paulo, envolveu-se com “atividades subversivas”, no dialeto milico. Foi tachada de “pé frio” por “articulações de direita”. Passou dois anos sem trabalhar direito. Recebia telefonemas assustadores com ameças de sequestro contra sua filha Mariana, então com quatro anos (às vezes, a garota era embrulhada num lençol, colocada num carro e despachada para longe, “para despistar”).

 

"Fui de jegue, de bicicleta, pagava passagem de avião"

 

Hoje, Fafá se considera amiga dos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso (mais) e Lula (menos). Também se diz próxima de dois presidenciáveis, o senador Aécio Neves (PSDB) e o governador Eduardo Campos (PSB) - que para ela são “Aecinho” e “Dudu”, os eternos garotões nos anos 80, ainda na sombra dos avôs Tancredo Neves (morto 39 dias após ser internado na véspera da posse como presidente, em 1985) e Miguel Arraes (ex-governador de Pernambuco).

As causas atuais pouco a comovem. Ela levou a filha para ver os jovens que foram às ruas pedir o impeachment de Fernando Collor, em 1992 (o ex-presidente voltou à vida política em 2007 e foi parar no Senado, onde é hoje colega do ex-cara pintada Lindberg Farias). “Olha, meu amor, adoraria que alguma coisa me tirasse a sério [de casa]”, diz a musa das Diretas Já. 


Mandacaru Atômico

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O livro de Renan Calheiros, lançado em 83, com apresentação de Ulysses Guimarães

O livro de Renan Calheiros, lançado em 83, com apresentação de Ulysses Guimarães

Bem antes de virar o tipo de pessoa em quem jogaria tomates no passado, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) era um cabra cabeludo envolvido numa tal de Viração, “facção do movimento estudantil que tinha como referência teórica o marxismo-leninismo”.

Trinta e cinco anos se passaram e, com quilos a mais e cabelo de menos, ele virou alvo de passeatas e de um abaixo-assinado virtual com 1,6 milhão de assinaturas. A turba pede (até agora em vão) seu impeachment da presidência do Senado. “Se fosse naquele período eu estaria, sim, nestes protestos”, diz o político alagoano que, em 2007, renunciou ao mesmo posto para não ser cassado.

Ele foi acusado, na época, de ter despesas pessoais pagas por um lobista que defendia os interesses de uma empreiteira – uma dessas faturas cobria a pensão da jornalista Mônica Veloso, mãe de uma filha sua fora do casamento (depois do escândalo, Mônica posou para a Playboy e lançou o livro O poder que seduz para contar sua versão da história de amor com o senador, que gostava de lhe cantarolar Eu sei que vou te amar, segundo a ex-amante).

Antes disso tudo acontecer, contudo, Renan foi um dos jovens alagoanos que tentavam derrubar o status quo (como define assessor próximo, “um comunistaço”). “Naquele tempo, a juventude, a militância política, era 100% de esquerda”, conta o senador por e-mail.

Nos anos 70, o estudante de Direito elegeu-se presidente do Diretório Acadêmico da área de Ciências Humanas e Social da Ufal (Universidade Federal da Alagoas). Daí para o Congresso foi um pulo de carniça. Renan foi escolhido entre os estudantes de seu Estado para disputar as eleições. Como era 1978, e a ditadura ainda não tinha pedido arrego, candidatou-se pela opção viável à época: o MDB (antepassado do PMDB e único partido com concessão para existir, além do governista Arena). Virou deputado estadual aos 23 anos. “Era a primeira vez que os movimentos sociais e estudantis largavam as intermináveis noitadas de embates retóricos descompromissados e lançavam seus quadros para a difícil disputa eleitoral. Subitamente deixaram de me chamar de 'comunista'. Era 'excelência' pra cá e pra lá. À época aquele grupo de estudantes que se aventurou no mandato foi batizado de as 'novas excelências'.”

No livro Contadores de balela, editado em 1983, a “nova excelência” agrupou seus primeiros discursos e projetos de lei apresentados no Congresso (foi eleito deputado federal em 1982). O prefácio é do colega Ulysses Guimarães, um dos fundadores do PMDB – a sigla foi criada em 1980, um ano após a anistia reabrir as portas para o pluripartidarismo. E essa “nova excelência”, dizia Ulysses, morto em 1992, possuía uma “virtude indispensável ao homem público: coragem. Não tem medo dos poderosos do dinheiro, dos facínoras da violência, dos aproveitadores da corrupção”.

 

“Se fosse naquele período eu estaria, sim, nestes protestos” 

 

Na tribuna, abraçava causas como eleições diretas e União Nacional dos Estudantes. “Atuei muito na entidade até porque meu irmão, Renildo Calheiros, e Aldo Rebelo, meu dileto amigo [e atual ministro do Esporte], foram presidentes”, diz sobre a UNE. Posava para fotos com silhueta mais longilínea (mas bochechas já salientes), de camisa branca para dentro da calça jeans afivelada com cinto preto. Num dos discursos, bradou: “Mais de um escândalo por mês. E estes são os que chegaram ao conhecimento da opinião pública, porque acabaram estourando, de tão escabrosos que eram. E os que estão para vir à tona? Como andará a incubadeira de escândalos nesses bastidores do arbítrio, da corrupção, do suborno, do tráfico de influências?”.

De lá pra cá, Renan se aliou a todos os presidentes pós-ditadura militar. Primeiro foi José Sarney, colega no PMDB. Do conterrâneo Fernando Collor, a quem antes chamava de “príncipe herdeiro da corrupção”, virou líder do governo na Câmara dos Deputados (apoiou seu impeachment em seguida). Dirigiu uma subsidiária da Petrobras no governo Itamar Franco. Foi ministro da Justiça de Fernando Henrique Cardoso. E, enfim, presidente do Senado na era Lula e Dilma Rousseff, apelidado “Mandacaru” pelos colegas, em homenagem a um tipo de cacto de superfície grossa e espinhenta.

Fred Melo Paiva

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Fred Melo Paiva

Fred Melo Paiva

O convidado de hoje do Trip FM é o jornalista Fred Melo Paiva. Ele trabalhou nos mais diversos veículos da comunicação brasileira, como no jornal O Estado de S. Paulo, nas revistas Playboy, Época Negócios, Veja, IstoÉ e também aqui nas revistas Trip e Tpm. Mineiro radicado em São Paulo e torcedor fanático do Atlético Mineiro, atualmente ele escreve uma coluna sobre o Galo no jornal Estado de Minas. E agora se prepara para lançar sua primeira incursão pelo jornalismo televisivo, o programa O Infiltrado, que estreia no próximo dia 7 de maio no canal a cabo History Channel.

Tony Bellotto

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Felipe Chiri

Tony Bellotto

Tony Bellotto

 

Tony Bellotto é fundador e guitarrista de uma das mais importantes bandas do Brasil, os Titãs, e há 20 anos ele se divide entre a criação de riffs e acordes de guitarra e a produção literária. Depois de comemorar os 30 anos do grupo no ano passado, este ano ele lança seu oitavo livro, Machu Picchu, pela editora Companhia das Letras.

Pai da Nina, do João e do Antônio e o marido da Malu Mader, o galã dos Titãs, Antônio Carlos Liberalli Bellotto é espécie de cruzamento entre Jimi Hendrix e Ernest Hemingway. Ele ainda apresenta no canal Futura o programa Afiando a Língua, onde encarna uma espécie de Professor Pasquale de jaqueta de couro.

Na entrevista ele falou sobre a vida em família, seu envolvimento com a literatura, sobre o programa de TV que apresenta no canal educacional e sobre os 30 anos da banda pioneira do rock paulista.

"Claro que rock não é esporte, mas é legal você manter a forma"

"O segredo da longevidade dos Titãs é justamente essa motivação que sentimos para sair e gravar coisas novas. É claro que a gente não vai ensaiar "Bichos Escrotos" ou "Polícia", que a gente já toca há mais de 25 anos", brincou o guitarrista. "O que mantém a gente vivo é olhar pra frente e ter o barato, sem Viagra, com o nosso trabalho novo. Ainda temos o mesmo gás que tínhamos em 1982 quando tocávamos na Caos Brasilis."

Tony falou também sobre uma declaração que deu anos antes, quando afirmou que ficava deprimido ao ver roqueiros barrigudos. Como o tema da Trip deste mês é Barriga, a questão não poderia passar em branco na entrevista.

"Eu não tenho preconceito com quem tem barriga", ele ri. "Tenho 52 anos e meu ideal de grande roqueiro é o Mick Jagger. O cara tem 70 anos e tá magrinho, com uma vitalidade incrível e cantando pra cacete. Eu admiro essa dedicação. Claro que rock não é esporte, mas é legal você manter a forma. É deprimente ver aquele cara que tá sem fôlego no palco. E a exceção é o Ozzy Osbourne, que é charmoso mesmo desse jeito."

"Estar do lado da Malu já é 80% do meu segredo de beleza"

Continuando no clima descontraído, Bellotto falou sobre o posto de galã oficial dos Titãs, que ocupa desde o início dos anos 80.

"Estar do lado da Malu [Mader, sua esposa] já é 80% do meu segredo de beleza. Sempre achei que essa vida de estrada e de show é cansativa. Então eu sempre fiz exercício, mesmo quando eu era doidão. Tento equilibrar minha alimentação também, mas sempre seu exagero. Hoje rola essa patrulha contra quem é gordo, que eu acho um absurdo. Cada um faz o que quer da vida."

Setlist do programa:

Taj Mahal - "Aint That a Lot of Love"
Jimi Hendrix - "Hey Joe"
Titãs - "Familia"
Slim Harpo - "Te Ni Nee Ni Nu"
Rolling Stones - "Shes a Rainbow"

Coitadinha Bem Feito

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jorge Bispo

Angela Ro Ro

Angela Ro Ro

Vozes masculinas de 17 artistas fazem Coitadinha Bem Feito, álbum virtual gratuito em homenagem à cantora, compositora e pianista carioca Angela Ro Ro. Com curadoria do jornalista Marcus Preto e direção geral do DJ Zé Pedro, os convidados para o projeto foram os cantores Lucas Santtana, Lirinha, Thiago Petit, Leo Cavalcanti, Tatá Aeroplano, Romulo Fróes, Kiko Dinucci, Gui Amabis, Adriano Cintra, Rodrigo Campos, Helio Flanders, Otto, Pélico, Juliano Gauche, Rael, Gustavo Galo e Daniel Black.

 

 Álbum "Coitadinha Bem Feito'

"Uma criança meio esquisita", é como Marcus Preto se define ao contar que ouvia Angela Ro Ro desde a infância. Encontrou no dono do selo do Joia Moderna, Zé Pedro, outro fã da cantora, o parceiro ideal para essa empreitada. Mas tinha um porém, o DJ queria apenas cantoras mulheres em seus CDs como marca de sua gravadora e o jornalista decidiu quebrar o hábito convidando apenas cantores. Para ele, os músicos inventaram um jeito de se comunicar que significa mais do que só cantar bem.

Todos foram responsáveis pelos arranjos, sem interferência de Marcus ou Zé Pedro. "Os caras mandaram muito bem, cada faixa que chegava para escutar era um 'Ufa!'. Eles são muito diferentes, fizeram coisas muito pessoais e pouco a ver com a Angela, mas que conseguem traduzir muito bem o nosso tempo. Existe aquela história de que se todo mundo cantar junto em uma sala soa afinado. E o conjunto do Coitadinha Bem Feito é isto, cada música se aproximou do cantor escolhido e todas formaram um CD que soa muito afinado também", diz Marcus.

Dois shows estão marcados no Sesc da Vila Mariana para o lançamento do álbum nos dias 7 e 8 de maio, com parte dos musicos que participam do disco.

Tatá Aeroplano, Thiago Pethit e Leo Cavalcanti falam sobre como foi participar da homenagem:

"Receber a música Balada da Arrasada pra fazer foi um presente. Me lembro do dia em que escutei essa canção com o Helio Flanders no vinil que ele tem da Ro Ro e de como essa música me emocionou. A letra é muito forte. A música é intensa e me emociona demais. Grava-la foi uma honra, Ro Ro é clássica! Convidei o Junior Boca pra gravar as guitarras e produzir a faixa, e também o Pedro Gongom da Trupe Chá de Boldo, que tocou bateria, o Meno Del Picchia que tocou baixo e o João Leão que fez piano e teclados. Gravamos no estúdio Submarino Fantástico em duas sessões com o Otávio Carvalho e vamos colocar a música nos próximos shows do meu disco." Tatá Aeroplano

"Fazer uma versão de qualquer música é sempre muito desafiador, pois não se trata de um desejo de fazer melhor do que a original ou mais dramático. Mas sim de explorar um tema particular e descobrir as nuances, semelhanças e diferenças entre o universo do compositor e o seu próprio universo enquanto artista e acabar transformando isso em uma linguagem própria. Por isso é tentador demais. Porque é audacioso querer brincar com as palavras de pessoas tão maravilhosas e geniais como a Angela Ro Ro. Agradeço imensamente o convite da Joia Moderna, pois, sem eles, talvez eu não tivesse coragem de regravar isso. Sempre fui fã da Angela e especialmente da canção Mares da Espanha. Além de ser linda, é uma música com uma dramaticidade muito peculiar e muito forte na voz e interpretação. Para achar o tom da versão, tentei privilegiar o lado mais felino, arisco e mais libidinoso das palavras da Angela. A voz de quem acorda em uma manhã de ressaca implorando pelo calor de alguém. Assim como a ressaca dos mares, tentando engolir com ondas tudo que vê pela frente." Thiago Pethit

"Foi com grande alegria que recebi o convite de Marcus Preto para fazer parte do disco, pois, além de ser uma adorável homenagem à esta grande artista que é Ro Ro, por quem sempre tive admiração, acho delicioso o desafio de criar uma nova interpretação e roupagem para uma canção que já foi gravada. Aproveitei a oportunidade para ir mais fundo na obra de Angela: comecei a pesquisar sua discografia, e um tesouro se revelou para mim, fazendo minha admiração aumentar. Angela é uma poeta brilhante. Sua poesia sangra e faz transparecer a brasa de seu coração. Suas canções revelam uma compositora que entende o significado profundo do que é 'canção'. É uma grande letrista, melodista - e cantora e pianista ímpar. Uma cantautora completa.Senti a necessidade de fazer uma interpretação delicada e doce para Came e Case, que é uma música simples sobre amor, paixão e libido - todos juntos, sem separação. Sobre a sacralidade de um encontro amoroso onde existe entrega total. Na interpretação de Angela, ela canta para uma mulher. Na minha intepretação, achei interessante inverter, e cantar para um homem: 'Esse tempo pouco/louco de amor/que você me dá/que você me dá/cheio de prazer'. Concebi o arranjo e imediatamente pensei em chamar o músico Bruno Serroni para tocar Cello e assinar a produção comigo. Fizemos a faixa juntos, e ele também fez a mixagem. Fiquei muito contente com o resultado - e ainda mais por integrar um projeto ao lado de amigos e artistas que tanto gosto e admiro." Leo Cavalcanti

E aqui, as faixas:

Amor, meu Grande Amor - Lucas Santtana
Renúncia - Lira
Came e Case - Leo Cavalcanti
Só nos Resta Viver - Romulo Fróes
Mares da Espanha - Thiago Pethit
Balada da Arrasada - Tatá Aeroplano
Coitadinha Bem Feito - Otto
Abre o Coração - Gui Amabis
Gota de Sangue - Adriano Cintra
Não Há Cabeça - Pélico
Fogueira - Rodrigo Campos
Tango da Bronquite - Kiko Dinucci
Perdoar-os, Pai - Rael
Fraca e Abusada - Gustavo Galo
Tola Foi Você - Dani Black
A Mim e a Mais Ninguém - Juliano Gauche
Me Acalmo Danando - Helio Flanders

Vai lá: Para baixar o álbum gratuitamente acesse www.coitadinhabemfeito.com.br

Show de lançamento do álbum Coitadinha, Bem Feito
Quando: 7 (terça) e 8 (quarta) de maio, às 21h
Onde: Sesc Vila Mariana - Rua Pelotas, 141 - Vila Mariana - São Paulo/SP - Tel (11) 5080-3000
Quanto: de R$8 a R$32 (ingressos limitados)

Thiago Pethit fez um vídeo autoral para divulgar a canção que gravou:

José de Abreu

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Fe Pinheiro

José de Abreu

José de Abreu

José de Abreu é um importante ator de teatro, televisão e cinema, com mais de 30 anos de profissão e incontáveis peças, novelas e filmes em sua carreira. Mas depois de conhecer um pouco sobre sua história e suas opiniões, fica difícil decidir se a gente admira mais seu trabalho, sua trajetória de vida ou a maneira honesta e corajosa com que ele se posiciona sobre os mais variados temas.

Depois de viver o vilão Nilo na novela que virou febre nacional no ano passado, Avenida Brasil, atualmente ele está em cartaz em São Paulo com a peça Bonifácio Bilhões e também no cinema com o filme Meu Pé de Laranja Lima.

O Trip FM recebe nesta semana o inigualável Zé de Abreu, que também nos deu o privilégio de ser capa e personagem das Páginas Negras da revista Trip do mês de abril.

Setlist do programa:

Baden Baden - "Evidemment"
Canned Heat -- "Going Up the Country"
Chico Buarque -- "Jorge Maravilha"
Ben Harper & Charlie Musselwhite -- "She Got Kick"
Mia Doi Todd & Jose Gonzales -- "Um Girassol da Cor dos Seus Cabelos"

O Trip FM vai ao ar na grande São Paulo às sextas às 20h, com reprise às terças às 23h pela Rádio Eldorado Brasil 3000, 107,3MHz


Amor nos tempos de comédia

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Luis Fernando Veríssimo

Luis Fernando Veríssimo

Luis Fernando Veríssimo fala à Trip sobre saúde, medo da morte e a mais nova adaptação de sua obra para a TV, uma série baseada em seus textos sobre casais

“Nós nunca mentimos. Quando mentimos, é para o bem de vocês.” A frase de Luis Fernando Verissimo abre o livro As mentiras que os homens contam, um dos best-sellers dele que traçam uma radiografia bem-humorada das relações entre casais. A visão do escritor gaúcho sobre o amor é tema de uma série de TV de 13 episódios – Amor Verissimo –, que será filmada em setembro pela Conspiração. A atração estreia no final do ano no GNT. Recentemente o humorista de 76 anos passou 24 dias no hospital por causa de uma gripe que evoluiu para uma infecção generalizada e prejudicou sua mobilidade. Casado há mais de 30 com Lúcia, sua primeira “namorada séria”, com quem tem três filhos, Verissimo falou à Trip sobre relacionamentos, humor e medo da morte.

Um casal rende boas piadas?
Como é aquela frase do Tolstoi? Todas as famílias felizes são iguais, mas cada uma é infeliz à sua maneira. Há mais maneiras de um casal se desentender do que de se entender, e há muitas maneiras de descrever isso, com mais ou menos humor.

Qual é o seu conto de amor preferido? Por quê?
Não é o favorito, mas um chamado “Bandeira branca” [leia aqui] circulou mais do que os outros e entrou em algumas antologias.

Qual a sua opinião sobre a nova geração de humoristas, como Marcelo Adnet, Fábio Porchat e Gregório Duvivier?
Tenho visto o trabalho deles, inclusive, no Porta dos fundos, e acho excelente. É uma nova fase do humor brasileiro, que se livra da velha tradição do circo, do rádio, do teatro de revista e da caricatura grotesca, como ainda se vê no Zorra total. Independentemente, claro, dos gênios do velho estilo, como o Chico Anysio.

Como está a sua saúde?
Está ótima. Tive que reaprender a andar, e isso me levou a fazer fisioterapia intensiva, o que tem sido muito bom.

Em entrevistas recentes, você citou alucinações que teve no hospital. Como foi?
Consistiam em ver coisas irreais à minha volta, como um esquema secreto de contrabando de crianças asiáticas na UTI do hospital. Eu não conseguia caminhar e, para sair da cama, tinha que ser com uma enfermeira, abraçado. Não sei se sonhei ou se foi verdade, mas tenho a lembrança clara de dançar uma valsa com ela.

O que você gostaria de fazer que não fez?
Meus projetos são todos de curto prazo, como o de viajar este ano para Paris e Londres.

Sente mais medo da morte hoje?
Medo, ou consciência, da morte eu tenho desde criança. Com a idade a gente se sente mais vulnerável. Mas fazer o quê? É como jogar contra um time que você sabe que no fim vai ganhar. Só nos resta tentar jogar bem e não dar vexame.

Carioca sangue bom

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O cara imita Jô Soares, Amaury Jr., Papa Francisco, Dilma Rousseff. E faz isso tão bem que alguns dos próprios alvos acham graça. Com vocês, o gênio do Pânico - desta vez, sem disfarces

Márvio Lúcio está resfriado. Ou tem uma virose, que é o diagnóstico padrão para os mal-estares modernos. Provavelmente pegou da filha de 1 ano, que passou madrugada dessas vomitando até às cinco da manhã. “Não tô legal”, ele admite. Mas nem por isso deixa de entrar na van para uma bateria de entrevistas com revista, rádio e TV Trip, seguidas de sessão de fotos. Durante a longa tarde, entre um cigarro e outro, fala empolgadamente de política, carreira, família, tira fotos com jornalistas e produtores, distribui sorrisos, bate papo com quem quiser papo.

É fácil ser levado pelo carisma que transformou Márvio em um dos humoristas mais conhecidos do Brasil. Nascido em Niterói e criado em São Gonçalo, alguns diriam que ele não pode ser chamado de carioca; o gentílico correto seria “fluminense”. Mas a alcunha ficou e hoje ele é, provavelmente, o fluminense mais carioca do Brasil. Márvio Lúcio, o Carioca, com seu sotaque cantado e humor naturalmente malandro, honra o apelido.

Até quem não assiste ao Pânico na Band, de cujo elenco o humorista faz parte desde os tempos do rádio, reconhece o Carioca por alguma de suas imitações hilárias. Jô Suado, Boris Casoy, Amaury Dumbo e Zeca Tamagro são alguns dos tipos que faz no programa e que o tornaram conhecido de ponta a ponta no país. Classificado por Danilo Gentili como o maior humorista e imitador do Brasil hoje, elogiado por seus imitados – Lulu Santos, um deles, viu o humorista na plateia de um show e agradeceu com uma canção –, Carioca vive seu melhor momento. Seu talento para os tipos ajuda a erguer o Ibope do Pânico, o maior da Band, e gera milhares de visualizações e comentários no YouTube, a maior parte vinda do público jovem. “Eu quero é tocar o terror”, ele solta, durante a sessão de fotos para esta edição. Apesar da ameaça, o niteroiense de 37 anos não quer ofender ninguém com suas caricaturas. Seu principal parceiro nos quadros do Pânico é Eduardo Sterblitch, que encarnava o famoso Freddie Mercury Prateado e com quem compartilha a veia nonsense.

 

“A comédia anda sempre no limite, se arrisca, e às vezes pode errar ou sair do que as pessoas estavam preparadas” para aceitar

 

Seu humor é menos polêmico do que aquele praticado por grande parte da trupe do Pânico. O programa sofre críticas constantes e é acusado de apelação. Carioca defende a “família Pânico”, como eles se denominam. “A comédia anda sempre no limite, se arrisca, e às vezes pode errar ou sair do que as pessoas estavam preparadas para aceitar. Mas sou a favor da total liberdade de expressão. Cada um fala o que quiser e o mercado absorve ou não”, justifica. Para ele, no momento existe no país uma “cruzada moral imbecil” que atrapalha.

Bate-bate

Dois casos recentes foram emblemáticos nesse teste de fronteiras. Primeiro, desistiu de Jô Suado, depois de ser esnobado em rede nacional por Jô Soares três vezes. Depois, abortou Edir Maiscedo, tentativa de imitar o bispo Edir Macedo. No primeiro caso, ficou magoado por não ter a bênção de um ídolo. No segundo, recuou por medo da gritaria. “É complicado brincar com religião e não quero polêmica.” Quando o personagem caiu, os evangélicos comemoraram na internet. Carioca não se importa, apesar do tempo que investe em cada tipo: sente a necessidade de entrar de cabeça nos personagens e começa observando a forma como a pessoa a ser imitada se comunica. “Olho mão, olhar, gestual, boca. O corpo fala. A voz é o mais difícil. Penso que tenho o mesmo trabalho de um cartunista, de notar detalhes; mas sou um cartunista da vida real. E não quero ser mais um. Quero oferecer algo de arte.”

Leu a autobiografia de Edir Macedo para entender o personagem e levou quatro meses para criar seu Boris Casoy. “Antes de fazer rir, quero que você se encante com minha proposta, o tipo, o jeito, a fala. É uma sedução, mesmo.” Com seu “Jornal do Boris”, ganhou até o próprio Casoy. Além de dar sua bênção, o jornalista fez uma espirituosa participação na bancada do “Jornal do Pânico” e, numa cena que Emilio Surita classifica como “uma das mais surreais da TV brasileira”, andou de carrinho de bate-bate com seu imitador. O personagem não existe mais. Quem lamenta é o próprio Casoy: “Virei um cara popular por causa da imitação. Achavam que eu era sisudo, agora me acham simpático. Até as crianças pedem para eu dar meu ‘boa noite’ agora.” Outro imitado que aprovou a “homenagem” foi o apresentador Amaury Jr. “As pessoas achavam que eu me irritaria porque ele fazia a caricatura com alta lubrificação etílica”, conta. “Mas eu achava o máximo. Por mim, ele teria o próprio programa.”

 

Ele anda com quatro feias dentaduras de plástico para poder imitar a qualquer hora Ronaldo Fenômeno, Dilma ou Lobão

 

Márvio Lúcio está com saudade do Rio de Janeiro, que trocou por São Paulo há 15 anos. Sente falta de ver o Pão de Açúcar quando vai para o trabalho, de mirar “o verde, o mar, o azul”. Dirigindo pelo caos do trânsito paulistano, sintoniza rádios da Cidade Maravilhosa só para ouvir o ritmo. Antes de virar o Carioca do Pânico, foi um esforçado produtor da rádio Joven Pan, no Rio. Era 1996. Quando não estava distribuindo adesivos promocionais da rádio nos semáforos, imprimia suas ideias, piadas e roteiros na Epson matricial da rádio e enviava para o seu programa preferido, um tal de Pânico, que a Jovem Pan de São Paulo transmitia para o país inteiro. Emilio Surita, o apresentador, lia as contribuições no ar e agradecia. “Valeu, Márvio, que sempre manda coisas boas lá do Rio.” Dois anos depois, foi chamado para trabalhar no programa radiofônico, que iria para a TV em 2003. E assim tudo começou.

Fe Pinheiro

Márvio Lúcio, o Carioca: gênio da imitação do Pânico na TV

Márvio Lúcio, o Carioca: gênio da imitação do Pânico na TV

Para ser justo, começou muito antes. Aos 5 anos de idade, montado de mulher pela irmã, Márvio fazia apresentações para tios, avós, “a velharada que ia lá em casa. Eles adoravam e eu passava o chapéu. Foi aí que descobri que dá pra ganhar dinheiro com essa merda”. Essa merda, no caso, é a nada fácil tarefa de conquistar o público com imitações. A primeira foi de Leonel Brizola, porque Márvio é louco por política. Sonhava ser congressista, quem sabe presidente da república. A primeira viagem a Brasília, em 1994, foi para assessorar um candidato a deputado na convenção que escolheria o presidenciável do PMDB. “Fui tentar, mas na primeira já desisti, cara. Senti que todo o esquema é corrupto”, lembra, com certa tristeza. Para piorar a impressão, alguém embolsou a grana que pagaria a comida da comitiva, e Márvio teve de bancar o almoço de muita gente. Nunca mais pensou em ser político, mas continuou acompanhando a arena: lê jornais todos os dias e sabe quem é quem no jogo de poder.

Entertainer

Depois do caudilho gaúcho vieram imitações de Gil Gomes, Raul Gil, Silvio Luiz, Muricy Ramalho, Caetano Veloso, Serginho Groisman, Biafra. Ele diz que a criação “solta”, no bairro de Boaçu, São Gonçalo, potencializou suas habilidades. A família é de gozadores, e ainda hoje fazem pegadinhas uns com os outros. O pai tinha fitas cassete com piadas do Costinha, que Márvio escutava escondido no som do carro. “Aquele monte de sacanagem, palavrão, foi uma escola”, ri, lembrando do mestre.

Ele se diz um entertainer – segundo o dicionário Michaelis, “pessoa que faz apresentações, profissionalmente, para a diversão dos outros”. Mas quem o conhece sabe que é, ele mesmo, um entretenimento full time. Sorrisos, tiradas e imitações saltam a todo momento de seu vasto repertório. Anda com quatro feias dentaduras de plástico para poder imitar a qualquer hora Ronaldo Fenômeno, Dilma, Lobão ou outro famoso. Imita amigos também, como seu patrão, Tutinha, dono da Jovem Pan, seu colega de elenco Bola e o maquiador do Pânico, de quem faz propaganda para a produção da Trip. Entende o sucesso, mas não parece muito interessado no estrelato. É aquele vizinho engraçado da periferia que chama a atenção nos churrascos pelo bom humor. Os nascidos no Rio que se adaptem: o fluminense Márvio Lúcio é um carioca sangue bom.

Caracterizador: Anderson Montes (Dinho)/ Figurino: Euller Sampaio

Casanova tupiniquim

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Nosso Repórter Excepcional vai em busca do criador de Zé Bonitinho na esperança de aprender com o mestre a arte de fazer sucesso com as mulheres

Ao longo da minha vida, gurus, escritores, divas, livres-pensadores e figuras atípicas em geral impregnaram o meu modo de ser, pensar e anarquizar. São os meus heróis. No universo do humor, desde a infância acompanhava gargalhando e imitando com o meu pai tudo aquilo que mestres como Jerry Lewis, Chico Anysio, Os Três Patetas, Charles Chaplin, Monty Python, Jô Soares, Golias, Catifunda e Os Trapalhões faziam.

Sempre fui adepto do humor, da gozação, da paródia e do esculacho em geral. No mais recôndito esconderijo da minha psique, um personagem esteve presente nas minhas brincadeiras e palhaçadas diárias. Uma criatura transcendental, imortalizada pelo seu criador, o ator e humorista Jorge Loredo, que conquistou milhões de fãs por todo o Brasil, com seus bordões invadindo lares e botequins. Com vocês, Zé Bonitinho!

Em pleno coração de Santa Teresa, no Rio de Janeiro, a porta da esperança se abriu e Jorge Loredo desceu do carro cumprimentando todos com extrema elegância e confirmando: “O chato não é ser bonito, o chato é ser gostoso”. Atônito, me ajoelhei diante daquela pessoa que marcara profundamente a minha vida. Estava frente a frente com o mentor do personagem Zé Bonitinho.

Meu inquietamento é notório. Desejo aprender tudo – técnicas, trejeitos, gags, bordões e idiossincrasias – deste artista fascinante. Afinal, quem não quer ser o “perigote das mulheres”? Avant-garde desde períodos ancestrais, Loredo desafia a caretice em um manancial inesgotável de sabedoria, tragédia e humor. Aos 89 anos, destila como ninguém detalhes minuciosos de seu passado glorioso.

Deborah Engel

Arthur segue as instruções de conquista do mestre

Arthur segue as instruções de conquista do mestre

Vou direto ao ponto, quero saber da mulherada nos tempos áureos. Jorge fazia jus aos bordões de Bonitinho? “Que nada, Arthur, sempre fui tímido com as beldades”, responde o humorista. E acrescenta: “A maioria dos artistas e comediantes é introvertida por natureza. Meu mestre Oscarito parecia um professor de latim. Não gostava de ser engraçado pessoalmente. Os grandes humoristas e comediantes que conheci passaram por sofrimentos e tragédias. A maioria sofre ou sofreu bastante bullying e preconceito”.

Zé perigote

Nossa conversa atravessa a trajetória de vida deste magistral comediante. Jorge resgata seu encontro com o mestre da mímica Marcel Marceau. Conta que estudava teatro nos anos 50 e 60, quando o francês veio com sua companhia ao Brasil. “Em sua apresentação-aula, Marcel me chamou para ser cobaia de seus movimentos no púlpito. Fiquei realizado. Ao final, fui convidado para ver seu espetáculo no Teatro Municipal. Até hoje não me esqueço. Ele fez, sozinho, o homem e o vento. Você jurava que estava ventando e ele se defendia do vento. Arte pura”, conta o comediante.

Veneração e entusiasmo dão o tom do meu estado de espírito. Recordando as muitas vezes que imitei os trejeitos e olhares deste Casanova tupiniquim, fui entrando no clima. Pergunto a ele sobre a origem de seus personagens. Afinal, de onde veio Zé Bonitinho? “Meu caro, o humorista de talento possui as mesmas qualidades de um grande fotógrafo. Ele vai observando e construindo seu personagem. O Zé Bonitinho nasceu de muita observação”, conta ele. Segundo o mestre, ele morava no bairro da Tijuca e passava os dias numa praça com uma turma de amigos, conversando e observando as garotas passarem. “Um deles se chamava Zé Perigote. Ele foi minha fonte de inspiração. Copiei tudo dele. Ele olhava uma mulher e dizia: ‘Aquela ali, huummmm’ ou ‘Aquela outra já peguei’. Se gabava de que havia estado com todas. Incrédulos, um dia o colocamos no paredão. Apontamos uma beldade de difícil acesso e comprometida. Ele disse: ‘Espera’. Um dia ela foi ao cinema sozinha. Ele sentou atrás dela. A mulher saiu e o sujeito nada. Depois veio com um sorriso dizendo: ‘Mais uma’. Descobrimos que o cara era uma grande farsa, não pegava ninguém.”

O tempo escoa e vou direto ao ponto. Não posso perder a oportunidade de aprender com o Zé Bonitinho como ter “a mulherada correndo atrás, mesmo sem ser bujão de gás”. Pergunto ao mestre: “Jorge, você poderia me ensinar a arte de cortejar do Zé Bonitinho?”. A lenda viva responde: “O negócio é o seguinte: você dá um olhar de desprezo e finge que não presta atenção. Fica sentado naquela pose clássica de pernas cruzadas do Albert Einstein. Você despreza, até que um dia vai se aproximando e tem o acasalamento. É a dança do lobo e da loba”.

Câmera, close!

Enquanto recita, percebo que Jorge incorpora o personagem e sigo seus movimentos como um fanático. Pequenas nuances vão se revelando, como a passada do dedinho na ponta da língua combinada com a perfeita levantada de sobrancelha. Repito milimetricamente o conjunto da obra. Segundo o mestre, o clímax que garante o enlace com a beldade está na lambida. Ensaio com ênfase e dedicação e finalizo com o clássico bordão: “If I had a thousand women, au auuu auuuuu”. O guru das cantadas sorri, aprovando meus movimentos.

Sou ligeiro e pergunto sobre stand-up comedy e os comediantes atuais. Loredo diz: “Aceito todos os movimentos. Humor é coisa séria, é liberdade. Basta ver os países ditatoriais, ali não existe humor. Brincando se passa uma mensagem. Os mestres Carlitos e Buster Keaton, por exemplo, transmitiam ideias com muita sabedoria”.

Autêntico aristocrata que é, sem dispensar nenhuma mesura ou salamaleque, nosso convidado se despede e não perde a oportunidade de dar uma sutil cantada em nossa produtora. Fiquei na minha, decodificando seus trejeitos. Seria aquele Jorge Loredo ou a entidade sedutora de Zé Bonitinho? Câmera, close!

Agradecimento: Brechó Minha avó tinha

Kaka Werá

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divulgação

Kaká Werá, escritor e ambientalista

Kaká Werá, escritor e ambientalista

Kaka Werá é escritor, ambientalista e há mais de 20 anos dirige o Instituto Arapoty, uma organização que difunde os valores da cultura indígena no Brasil. A ONG trabalha na formação de gerações mais conscientes da nossa interdependência e da responsabilidade que cada pessoa, e suas ações, têm na construção da realidade e do mundo em que vivemos.

Índio de origem Txucarramãe, ele nasceu em São Paulo, cidade onde seus pais se refugiaram depois de fugirem de fazendeiros do interior de Minas Gerias. Aqui, ao mesmo tempo em que estudou em escolas públicas, se aproximou e foi “adotado” pelas tribos Guaranis, se aprofundando no conhecimento dessas duas sociedades. E é exatamente essa formação na cultura indígena e na cultura ocidental que faz dele um importante interlocutor, uma importante ponte na estrada que pode, e deve, nos levar à uma convivência mais pacífica não só entre brancos e índios, mas entre as pessoas e a natureza.

A entrevista desta semana no Trip FM é com o ativista indígena que foi um dos homenageados do Trip Transformadores de 2010 e que é autor de livros como A Terra de Mil Povos e As Fabulosas Fábulas de Iauaretê, ambos lançados pela Editora Peirópolis.

O Trip FM vai ao ar na grande São Paulo às sextas às 20h, com reprise às terças às 23h pela Rádio Eldorado Brasil 3000, 107,3MHz

Jeff Hakman riu por último

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Do posto de mais jovem campeão mundial de surfe ao fundo do poço do consumo de heroína, o americano Jeff Hakman viveu de tudo um muito. Trip conversou com o homem em uma praia paulista, entre risadas, memórias e garfadas de arroz com feijão

“Call me Jeff”, ele disse de cara. Encontrei Jeff Hakman, o “ex-junkie legend” – quem o definiu assim certa vez foi o cineasta Marcos Prado – junto com Bob McKnight (hoje presidente do conselho da Quiksilver, depois de 40 anos como CEO) na praia, apresentado por um amigo em comum, Alfio Lagnado. Com poucos traços que denunciem seus 64 anos visceralmente vividos, Jeff, longe da terceira idade, está mais para quem terceirizou a idade: parece que pelo menos dez anos da sua existência foram entregues para algum incauto menos energizado carregar e metabolizar, enquanto ele simplesmente sorri.

Com entusiasmo, ele começa a contar histórias vivas, cheias de tsunamis pessoais. Uma estranha e poderosa energia interior sobressai a cada palavra. De que outra maneira alguém poderia ter descido ao inferno da heroína por diversas vezes, beijado o Diabo na boca, emergido para contar qual o sabor dos lábios do coisa-ruim e ainda, sexagenário e cheio de energia, querer vir morar no Brasil e recomeçar a vida mais uma vez? Fucking amazing.

Para Jeff o surf começou em Palos Verdes, Califórnia. Aos 8 anos, levou um caldo traumático que o manteve longe da água por um ano. O pai o incentivou a insistir. Na primeira onda boa, a maravilha venceu o medo. Dois anos depois convenceu os pais a se mudarem para o Havaí.

“Embora existam muitas pessoas surfando no planeta, não há muitos surfistas genuínos, na sua forma mais pura. Esses indivíduos são únicos e todos têm uma paixão em comum, num nível muito alto”

Aos 18, na fila de alistamento para a Guerra do Vietnã, protagonizou um desempenho convincente como homossexual que lhe valeu a dispensa do Exército. Em 1969, aos 21, já considerado o melhor surfista de competição do mundo, revelou-se um dos piores contrabandistas do planeta – e também um dos mais sortudos. Foi pego por federais com alguns quilos de maconha que ele e o amigo Buddy Boy Kahoe (que faleceria anos depois de overdose de heroína) enviaram para si próprios, em caixas de som revestidas de papelão, da Tailândia para Haleiwa, na Costa Norte de Oahu, no Havaí. Mas se safou devido a duas falhas técnicas do DEA (o departamento de combate às drogas dos EUA ): 1) Interceptar o correio é ilegal e qualquer prova que emane daí é inválida. 2) Os policiais seguraram as evidências tempo demais. Essas ações, pela lei americana, são inconstitucionais. O juiz desqualificou as acusações. Por pouco, em vez de contemplar as plantações de cana-de-açúcar que emolduram a paisagem do arquipélago, Jeff não apreciou outro tipo de cana, bem mais amarga.

O mais baixo da classe

Andando pela praia até minha casa, no litoral norte paulista (eu queria lhe dar meu livro Almaquática, feito com o fotógrafo Klaus Mitteldorf e o designer David Carson, que Jeff conhecia de outros carnavais), ele falou do fascínio com o Brasil: “Vivo na França há 30 anos. Os invernos são muito longos. O Brasil é uma ótima alternativa. Você ainda encontra praias vazias, vida selvagem, ótima comida, bom tempo e um estilo de vida vibrante que não é muito caro”. Sobre o surf, acredita que, “embora existam muitas pessoas surfando no planeta, não há muitos surfistas genuínos, na sua forma mais pura. Esses indivíduos, eu são únicos, e todos têm uma paixão em comum num nível muito alto”.

Eu ouvia tudo isso do cara que foi, aos 17 anos, o mais jovem campeão mundial de todos os tempos. Embora não houvesse na época o Campeonato Mundial no formato que conhecemos hoje, não é exagero dizer que Jeff dominou o esporte na maior parte da década de 70, vencendo por duas vezes o prestigiado Campeonato Eddie Aikau Invitational, por três vezes o Hang Ten Invitational e levando o caneco do primeiro Pipeline Masters e do Guston Pro na África do Sul. Ainda aos 17, foi eleito o melhor surfista de ondas grandes do mundo. Casca-grossíssima. Que, curiosamente, foi o garoto mais baixo da classe nos tempos de escola. Teria sido essa característica um motivador extra? Ele admite que o fato adicionou vontade a mais para superar obstáculos e mostrar que podia fazer e acontecer. O surf agradece Jeff não ser 10 centímetros mais alto.

“Vivi na França por 30 anos, os invernos são muito longos. O Brasil é uma ótima alternativa. Você ainda encontra praias vazias, vida selvagem, ótima comida, bom tempo e um estilo de vida vibrante e não muito caro”

Falamos muito de suas performances nas décadas de 1970, em especial de uma na praia de Puntas Rocas, no Peru, quando Jeff ostentava a prancha gun branca e se destacava pelos fortes e precisos botton-turns, projetando linhas longas, traçadas com fluidez e o famoso power difícil de definir, com o centro de gravidade baixo, que os juízes adoravam. Nomes de surfistas peruanos da época foram pipocando na conversa – Felipe Pomar, Gordo Barreda, Chino Malpartida, Fernán Ortíz de Zeballos. A noção de hospitalidade de alguns peruanos (e brasileiros) com os surfistas estrangeiros passava pelo fornecimento de presentes psicodélicos – cocaína e maconha. Eram tempos de excesso de experimentação com pouca informação. O costume cimentou amizades e diluiu vidas. Jeff foi fundo.

Posição fetal

Em 1973, acompanhado da namorada Sandy Raymond e do compadre Gerry Lopez, desbravou Bali, suas ondas e seus cogumelos. Deslumbrados, surfaram Uluwatu e Kuta Reef non-stop. Foi nessa época que a heroína, que seria sua companheira por anos, foi apresentada por Sandy. Um ano depois, houve a final antológica do Duke Kahanamoku Invitational em Waimea Bay, contra Reno Abelira, na qual Jeff ficou em segundo por margem mínima, no maior mar surfado em um campeonato até então, com séries de até 30 pés (10 metros). Muitos surfistas se recusaram a entrar na água. Ele entrou ainda na madrugada, para treinar e se adaptar às condições extremas antes da competição.

Arquivo pessoal

Jeff e o pai saindo de uma session no Havaí

Jeff e o pai saindo de uma session no Havaí

Em 1975, vendo o sucesso de marcas como a Lightning Bolt, levadas pela aura de Gerry Lopez, Jeff e Bob McKnight resolveram entrar na indústria de surfwear. Jeff sabia tudo de surf; Bob, administrador de empresas, sabia tudo de negócios: a parceria de sonho. Jeff tinha gostado de uma bermuda emprestada pelo amigo australiano Mark Warren. O nome da marca? Quiksilver. Decidiu ir atrás da licença para levar para os EUA. Em Bell’s Beach, jantou com Alan Green, um dos donos da marca, que não estava convencido da proposta. “O que preciso fazer para ter a licença? Querem que eu coma essa toalha de papel?”, provocou Jeff, que em seguida pegou a toalha, mastigou e engoliu. Ganhou.

No curto período na Austrália, sob o efeito avassalador da heroína, o campeão conseguiu fazer o maior negócio da sua vida além de ser o primeiro estrangeiro a vencer o Bell’s Beach Contest, sem que ninguém percebesse o que se passava dentro dele. Na volta para o Havaí, Jeff passou as 12 horas de voo encolhido, tremendo, em posição fetal. A droga cobrava seu tributo.

Sua resistência insana veio à tona novamente em 1981, quando ele não conseguiu sair por cima da junção de uma onda de 10 pés que ia se fechando em Backyards, Oahu. Jeff foi jogado de cabeça no recife de coral. Conseguiu chegar à praia, onde o amigo e famoso fabricante de pranchas de surf Tom Parrish tentou não vomitar ao ver o ferimento que abriu uma avenida irregular em sua testa. Tom respirou fundo e o levou ao hospital. Lá chegando, os médicos que costuraram os mais de 50 pontos no escalpo dilacerado não podiam acreditar que ele não havia desmaiado com o impacto. Permanecer consciente foi o que salvou a sua vida.

Atrás do balcão

A bela biografia de Jeff, Mr. Sunset, escrita por Phil Jarratt e lançada em 1997, narra com precisão e crueza como ele ganhou grana levando a Quiksilver da Austrália para os EUA – e como detonou tudo com as drogas, sendo “deletado” na companhia. Ele se recuperou anos depois, ao introduzir a marca na Europa, enfatizando mais o lado ‘snowboard’ do business. Outra vez milionário, cedeu novamente ao sussurrar da serpente: vendeu ações da empresa, que foram parar direto no seu braço, a preço de abacaxi.

Uma metáfora suave (e terrível) descreve a recaída na heroína como a tap on the shoulder, “um tapinha nas costas”. Distraiu, olhou para trás, dançou. Quando a Quiksilver na Europa estava começando a decolar, Jeff desviou dinheiro da companhia e dos amigos que haviam lhe dado outra chance para sustentar a nova escorregada. Sentiu-se culpado, mas a lógica do vício não considera ética ou amizade. Para a heroína não existe mundo lá fora.

“Eu tinha 13 anos e meu pai, um Waterman experiente, falava: ‘Vamos lá! se você estiver se afogando eu te tiro’. só que quando entrava a série [em Waimea], ele era o primeiro a ser varrido!”

Quando, em 1982, sua mulher na época, Cherie Radcliffe, o acordou no meio de uma noite para irem ao hospital – o primeiro filho do casal ia nascer – Jeff a levou, mas saiu em seguida para mais uma dose. Na volta, viu o nascimento de Ryan através da cortina difusa de loucura da heroína. Tempos depois, foi levado por amigos para um programa de reabilitação numa das melhores clínicas do mundo, em Londres. Livrou-se da droga e reconhece que o lugar ensinou muito, inclusive a dizer não.

Limpo, mas falido, Jeff foi morar em Gold Coast, na Austrália, a poucos passos do pico de Burleigh Heads, com Cherie e Ryan (um ano depois viria a filha, Lea). Para pôr comida na mesa, engoliu o orgulho e pediu emprego na surfshop do amigo Paul Nielsen. Após longos segundos de silêncio e constrangimento ao telefone, Nielsen aceitou. Certo dia, Nat Young, famoso surfista australiano que havia competido com Jeff, entrou na loja e não acreditou quando o viu atrás do balcão. Outros amigos que passavam por lá, ao verem o lendário Mr. Sunset vendendo parafina, também não sabiam o que dizer. Mas ele foi se reerguendo. Surfava quase todo dia, deu aulas de surf para crianças – e se lembra desse tempo como um dos mais felizes da sua vida.

Arquivo pessoal

com Alan Green, fundador da Quiksilver, no Tahiti, em 1978

com Alan Green, fundador da Quiksilver, no Tahiti, em 1978

Resiliência

Sentado na minha varanda, olhando ao mar, ele diz num tom mais introspectivo: “Cometi muitos erros, Sidão”. “Ei, Jeff, quem não cometeu? Isso é passado, o negócio é focar no hoje.” Ele sorri mais uma vez. Quando pergunto se ele sente ter o poder de reconstruir a sua vida no momento que quiser, a resposta é: “Eu costumava pensar isso, hoje é muito mais difícil”.

Fico imaginando se a mesma força interior que o fez remar com o pai para o outside de Waimea, ainda menino, lhe deu a luz para sair fora da pegada da heroína, substância que o Rolling Stone Keith Richards definiu como “a mais sedutora das drogas”. Jeff Hakman confirma que a coisa mais difícil com a qual teve que lidar na vida, a número um, de longe, é mesmo o vício. Nada que o tenha transformado em uma pessoa amarga ou sem humor. Perguntado sobre uma cena engraçada na sua vida, ele lembra de um episódio recente, quando dirigiu 30 minutos para ir surfar em Byron Bay, na Austrália, com o filho Ryan: saiu do carro, colocou o calção, pegou a parafina, trancou o carro... e então viu que tinha esquecido a prancha.

Também é rindo que ele conta, entre garfadas de arroz integral com feijão preto e salada de couve-flor com brócolis, que devorou com apetite de náufrago (e repetiu), como foi ter 13 anos e entrar em Waimea. “Eu estava cagando de medo”, ele diz. “Meu pai, um waterman experiente, falava: ‘Vamos lá! Se você estiver se afogando eu te tiro’, só que, quando entrava a série, ele era o primeiro a ser varrido! E eu ficava cagando de medo ainda mais, boiando sozinho.”

O périplo de outro campeão mundial, Andy Irons, na onda das drogas, teve resultado oposto. Jeff foi fundo, mas veio à tona, duas, três, dez vezes. Irons subiu precocemente para o andar de cima. Não sei até que ponto ele está consciente da própria resiliência; o fato é que está reconstruído. Hoje é consultor de marketing da Quiksilver, tem amigos por todo o mundo e uma namorada brasileira, com quem se casa em breve. O que fica da vida de montanha-russa? “Os poucos instantes em que estou totalmente no presente, apenas sendo, apreciando o momento”.

Mais do que ganhar campeonatos, fazer amigos, rodar o mundo, ter empresas de sucesso, comer arroz e feijão com histórias, experimentar de tudo um muito, regenerar-se parece ser a grande especialidade e o talento diferenciado de Jeff Hakman. Saber lidar de maneira instintiva com as profundezas abissais do mar e da alma, e com os altos cumes da experiência humana.

Jeff, uma onda de cada vez, amigo. Aloha.

*Sidney Luiz Tenucci Jr., o Sidão, foi criador da OP Ocean Pacific no Brasil. Jornalista formado pela USP, é colunista do site Waves e autor dos livros Almaquática (ed. Terra Virgem), O surfista peregrino e Poentes de amor (ed. Decor). Lança em breve Os sete chakras geográficos, pela ed. NeoAnima.

A volta do Velho Maza

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Reprodução/Facebook

Mazinho Lima, o Velho Maza

Mazinho Lima, o Velho Maza

Aos 50 anos de idade, um ícone dos primeiros acordes do mangue beat volta a trazer seu caldeirão musical para São Paulo. Mazinho Lima, o Velho Maza, que integrava a formação do pioneiríssimo Mestre Ambrósio, se apresenta na terça (14) na Choperia do SESC Pompeia, apresentando o repertório de seu primeiro álbum solo, o excelente Músicas para dançar, cantar, ouvir, lançado ainda em janeiro deste ano e disponível na integra no perfil de Maza no Soundcloud.

Gravando quase todos os instrumentos (exceto pela bateria, gravada por outro ex-Mestre Ambrosio, Éder Rocha), Mazinho compilou carinhosamente composições antigas e novas criações em um disco irretocável que traz influências tão diferentes como Fagner, Alceu Valença, Led Zeppelin e de tantas guitar bands. Mas não espere um show intimista durante a apresentação de sua banda no festival Prata da Casa, porque o violonista chega bem acompanhado para fazer barulho no palco do SESC.

"A banda está montada e de sozinho eu não vou ter nada", ri o compositor pernambucano em entrevista à Trip. "Vamos tocar como um quarteto com o Arruda no baixo, Éder 'O Rocha' (ex-Mestre Ambrósio) na bateria e o Ricardo Carneiro na guitarra. Esse show ainda vai ter a participação especial de Mestre Nico e mais algumas surpresinhas. Quem for ao show, verá."

"Sempre fui muito eclético e gosto de muita coisa diferente. Eu gosto de rock, de samba, enfim. O próprio Mestre Ambrósio já era assim. Apesar de nós, na época, trabalharmos com uma linguagem musical bem nordestina, nossa bagagem musical era totalmente diferente", continuou Maza, comentando as diferentes influências presentes em seu primeiro trabalho solo. "Os seis integrantes tinham suas próprias influências, mesmo com o foco do grupo ficando na música regional."

O tempo passa

Em 1992, quando o Mestre Ambrosio foi fundado por Siba e companhia, a visão de mundo percebida por Mazinho era quase que diametralmente oposta à que tem hoje. O próprio Maza comentou as mudanças pelas quais ele e o país passaram nesses últimos 30 anos, usando como exemplo o que aconteceu com a economia brasileira após o plano real.

"Vão se passando os anos e você vai vendo coisas e coisas. Eu não imaginava nunca que o Brasil chegaria nessa situação econômica em que nos encontramos hoje, por exemplo. Não dava pra imaginar um Brasil sem inflação há 30 anos", reflete o compositor, que passou recentemente da faixa dos cinco-ponto-zero. "Meio século faz com que a gente perceba e constate cada vez mais mudanças. E isso é mostrado diretamente na minha música. Escrever agora é muito mais fácil do que antes. Com cinquenta anos você consegue perceber muito melhor e mais exatamente o que você quer dizer. Antigamente eu tinha mais gás, mas hoje é bem mais fácil fazer música mais objetivamente."

Mesmo com o implacável avanço do relógio, os fãs do som do Mestre Ambrósio tem muito o que se identificar com a sonoridade da carreira solo de Mazinho Lima. "Nos shows não haverá nada de Mestre Ambrósio. Musicalmente, claro, há referências que vão tocar os fãs da banda. Mas não diretamente. A maior parte delas são referências para Ambrosio também. Mas aquela pegada forte do maracatu, não. Prefiro guardá-las para quando os outros cinco estiverem comigo [gargalhadas]."

Ouça o disco de estreia da carreira solo de Velho Maza na íntegra abaixo.

Vai lá: Velho Maza no Prata da Casa
Quando: 14/05, terça, Às 21h
Onde: SESC Pompeia - Rua Clélia, 93 - Pompeia, São Paulo
Quanto: Grátis
Ingressos: Pela rede IngressoSESC
Informações: (11) 3871-7700

Antonio Tabet, o Kibe Loco

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Criador do Kibe Loco, um dos sites de humor mais acessados da Internet brasileira, e do Porta dos Fundos, a série de programas on-line que virou mania nacional, Antonio Tabet explica a trajetória de publicitário-que-virou-blogueiro-que-virou-ator e entrega: “Ser reconhecido me envaidece”

Antonio Pedro Tabet, publicitário por formação, blogueiro famoso quase por acaso e agora mais conhecido como “um dos caras do Porta dos Fundos”, o programa de humor que sacramentou a noção de que, sim, a televisão do futuro (ao menos até onde podemos vislumbrá-lo) é a internet, talvez nem tenha se dado conta: ele é prova de que John Cleese estava certo.

Cleese, o britânico com meio século de serviços prestados ao humor de alto nível – é um dos fundadores do Monty Python, grupo surgido em 1969 na TV inglesa e reverenciado por gerações de comediantes –, foi quem disse a frase que abre este texto, proferida em uma das inúmeras vezes em que foi consultado sobre “como ser criativo”. Tabet, um carioca de 38 anos que em 1994 entrou no curso de comunicação da UFRJ disposto a se tornar um publicitário de sucesso, desses que vivem em “escritórios branquinhos cheios de pufes” (a definição é dele), entre idas a Cannes e doses de champanhe, descobriu brincando, matando hora no expediente, que o caminho do sucesso estava longe dos leões de metal distribuídos na Riviera Francesa. Estava na internet.

No ano de 2002, funcionário frustrado do departamento de marketing do banco Icatu, Tabet passava as tardes enviando piadas e fotomontagens por e-mail aos colegas da empresa. Advertido por “um babaca do departamento de TI” (a definição também é dele) de que as brincadeiras seriam monitoradas pela empresa, achou por bem parar de usar o correio eletrônico da firma e passou a despejar as gracinhas em um blog, que ganhou o mesmo nome da coluna que produzia no jornal da faculdade: Kibe Loco – Kibe por causa de sua ascendência árabe; Loco por ser o portunhol o idioma oficial da extinta coluna.

Nascia uma das páginas mais acessadas da internet brasileira. Em 2005, a audiência era tal que o blog virou ocupação principal, remunerada pelo portal Globo.com, que o hospedava. Passados 11 anos, o Kibe segue como fonte de renda, trazida não só pelo hospedeiro, agora o R7, da Record, mas também pelas marcas que o elegem como vitrine para aparecer.

Sociedade alternativa

Mesmo quem não costuma digitar www.kibeloco.com.br para ver as blagues postadas diariamente por Tabet (e dois ajudantes de texto e arte) certamente já foi atingido por algum dos conteúdos que, para usar o internetês do Brasil, “bombaram” por causa dele. Dois exemplos: o vídeo de 2004 em que William Bonner imita o estilista Clodovil em um intervalo do Jornal Nacional (visto 4 milhões de vezes) e o clipe de “Dança do quadrado”, produção de baixíssimo orçamento lançada em 2008 que se tornou um dos vídeos virais de maior sucesso do país e rendeu a Tabet um prêmio da MTV.

Jorge Bispo

Antonio Tabet

Antonio Tabet

De olho na verve que deu origem a tais sucessos (e a sátiras como a que colocou a senadora Heloísa Helena numa capa da revista Playboy), Luciano Huck o convidou em 2007 para fazer parte da equipe do Caldeirão do Huck. A parceria terminou em janeiro de 2012, quando Tabet, que vinha de um certo desgaste na Globo (onde tentou emplacar, sem sucesso, projetos paralelos ao Caldeirão), decidiu que era hora de zarpar. A mudança o levou ao retumbante sucesso Porta dos Fundos, que desde agosto de 2012 já lançou quase 90 vídeos em um canal do YouTube e contabilizava no fechamento desta edição 2.622.000 espectadores inscritos e mais de 226 milhões de exibições.

O projeto começou com um encontro entre Tabet e Ian SBF, então diretor do Casseta & planeta, no início do ano passado. Como ele, Ian também produzia conteúdo de humor na internet, os vídeos do canal Anões em chamas. Entre chopes e petiscos do bar Diagonal, no Leblon, a dupla combinou de produzir episódios de CSI Nova Iguaçu, versão esculhambada de séries sobre investigação policial.

A ideia de fazer vídeos de humor para exibir na web atraiu um amigo de Ian, Fabio Porchat, talento da comédia stand-up que também tinha um pé na Globo. Pouco depois, embarcavam no negócio o ator e roteirista Gregório Duvivier e o publicitário João Vicente de Castro, outro egresso da equipe do Caldeirão. Estava formada a sociedade que nasceu alternativa – mas que hoje está por cima da carne-seca. Toda segunda e quinta-feira, quando são colocados novos episódios no ar, os cliques, likes e compartilhamentos on-line só aumentam.

Alegria de classe média

Assistidos por milhões de pessoas, prestigiados pelos colegas de profissão, assediados por emissoras de TV, os integrantes do Porta dos Fundos somam hoje quase 30 pessoas – os cinco sócios mais atores, editores e técnicos contratados. O grupo também caiu nas graças de diretores de marketing – ao menos os que entenderam que, em tempos de redes sociais, não adianta tentar abafar críticas ou dar respostas evasivas ao público: as marcas devem entrar no jogo com transparência; melhor ainda se for com bom humor.

Foi o que fez a rede de restaurantes Spoleto, alvo de um dos primeiros episódios da trupe. O vídeo que mostra uma consumidora sendo maltratada por um atendente da rede levou a marca a contratar o grupo para criar outro vídeo, este em seu favor. O case fez com que outras marcas aderissem à estratégia de rir de si mesmas: o Porta dos Fundos já produziu trabalhos sob encomenda para Bis Lacta, Fiat e Caixa Econômica.

Tabet não fala em valores, nem mesmo o custo dessa estrutura. “Primeiro porque correria o risco de dar um número errado”, diz ele. “Segundo porque nos comprometemos a não falar de grana.”

Ele recebeu a Trip no escritório do Kibe Loco, no Jardim Botânico, no Rio. Os quadros na parede revelam um pouco da vida do dono – de uma camisa do Flamengo emoldurada a imagens de reportagens que saíram com ele na imprensa. Tabet teme que a decoração dê sobre ele a falsa impressão de “empresário bem-sucedido se vangloriando de seus feitos”. E trata de explicar que a aparente egolatria é só “alegria de classe média”.

"Eu era o cara que se apaixonava. Chorei muito por mulher na escola"

Fã de Millôr Fernandes, Luis Fernando Verissimo, Tutty Vasques – e, claro, Monty Python, ao qual o Porta dos Fundos é corriqueiramente comparado –, Antonio Tabet não se importa com “a onda politicamente correta” que pareceu ameaçar comediantes ultimamente. Para ele, é bom que humoristas se policiem para que, em vez de cair em piadas agressivas, encontrem algo que faça mais gente rir junto. Uma ideia, aliás, também defendida por John Cleese, para quem o grande poder do riso é justamente o de igualar as pessoas, “destruindo qualquer sistema de divisão social”.

Vamos do começo: como é a história da sua família? 
Meu avô paterno era libanês, mas não conheço muitos detalhes. E a família por parte de mãe é portuguesa. Meus pais nasceram no Rio e viraram médicos, os dois. Tenho dois irmãos mais novos, um é médico e o outro é advogado, Marco Antonio e Fernando Antonio, que era o nome do meu pai também.

Seu pai já morreu? 
Meu pai morreu quando eu tinha 15 anos e foi a pior coisa que aconteceu na minha vida.

Do que ele morreu? 
Câncer. Meu pai era um médico respeitado, foi diretor do [Hospital] Pedro Ernesto, diretor da Uerj, já tinha sido convidado pra trabalhar em Secretaria de Saúde. E era um cara forte, corpulento, corria na praia todo dia. Ele teve câncer no cérebro, muito difícil de lidar porque tinha dia que ele estava ótimo e tinha dia que ele estava um vegetal. Então, de uma estrutura familiar toda montadinha – pai, mãe, eu, um irmão dois anos mais novo e outro que tinha acabado de nascer –, entramos num caos. Quando meu irmão fez 1 ano meu pai descobriu a doença. Dois anos depois ele morreu. Durante o tratamento, fiquei muito próximo dele, cheguei a dar banho, um processo doloroso. E quando ele morreu foi uma porrada porque eu tinha certeza de que ele ia ficar vivo.

Arquivo pessoal

Com Totoro, do Porta dos Fundos (2012)

Com Totoro, do Porta dos Fundos (2012)

Como foi o dia em que ele morreu? 
Ligaram no colégio falando pra eu ir pro hospital. Chegando lá um tio me abraçou tão apertado que até me machucou. Quando vi que ele estava chorando, não precisei perguntar nada. E aí eu chorei, chorei, chorei. Quando fui ver meu pai, abracei, mas tive aquela sensação que descrevem, de que a pessoa não está mais ali. Por muito tempo fiquei mal, virei uma pessoa angustiada. Isso só acabou com um sonho em que meu pai aparecia e dizia: “Cara, não sofre. Você aí sofrendo tá me fazendo sofrer aqui”. Eu estava com uns 20 anos e só então aceitei que tinha que seguir com a vida.

E como é a relação com a sua mãe? 
Foi muito boa até a morte do meu pai. Depois, ficou um pouco estremecida. Acho que minha mãe tinha muito medo de viver como a minha avó, que morreu viúva, morando num apartamento com a irmã em Copacabana. Então quando meu pai morreu ela deu uma surtada. Trabalhava muito e manteve nosso padrão de vida, mas nossa relação pessoal se desgastou. Ela casou de novo, depois separou. Hoje é tranquilo, relação normal, de mãe e filho.

Onde era a casa de vocês? 
Botafogo. Morávamos num prédio do caralho, cheio de criança, play gigante, guerra com o prédio da frente, amigos, futebol, campeonatos de botão. Minhas memórias de infância são as melhores do mundo. Com 11 anos andava de ônibus pra onde quisesse, ia à praia.

E onde você estudava? 
No Santo Inácio, até a doença do meu pai. Aí repeti a oitava série e mudei pro Santa Rosa de Lima. Saí de um colégio de padre pra um colégio de freira. Foi a melhor coisa, conheci outros tipos de pessoas, amigos que tenho até hoje.

Você namorou muito? Era pegador? 
Nada, eu era o cara que me apaixonava, levava cartãozinho, caixa de bombons. Minha primeira vez foi no meu quarto, na minha casa, com a minha primeira namorada, que era virgem também. E foi espetacular. Enfim, chorei muito por mulher na escola. Depois de velho isso passou.

Você é mais assediado agora que é famoso? 
Não, acho que não. Primeiro que eu não sou um galã, né? Não sou o bonitinho de 26 anos, tenho 38! E até pareço mais velho. A figura da “maria comédia” eu já vi por aí. Tem umas até conhecidas, você chega num lugar e o pessoal já fala: “Olha lá a fulana, querendo descobrir qual o pau mais engraçado do Brasil”. Mas eu não entro nessa. E, como falei, tem muitos outros caras na minha frente. Muito Danilo Gentilli pra elas se interessarem [risos].

Você é casado? Tem filhos?
Dessa parte da vida pessoal, família, não falo e nunca vou falar. Prefiro ser Antonio Fagundes nessas horas.

Você é publicitário, certo? Como foi sua trajetória profissional? 
Fiz publicidade na UFRJ, uma merda de curso, mas fui até o final. Ainda na faculdade fiz estágio na Rádio Globo, indo pra rua ver cadáver no jornalismo, cobrindo vestiário de Bangu e América em Moça Bonita... De lá fui para uma agência de publicidade pequena, depois consegui estágio na programação do Multishow, maravilhoso, porque me obrigou a assistir a todos os episódios de Trapalhões, I love Lucy, Kids in the hall... esse, aliás, mudou minha vida, virou referência. Depois fui para a programação do GNT. Mas aí recebi o convite para ir trabalhar no marketing de um banco de investimentos, o Icatu, com um salário bem melhor.

Como era o trabalho no banco? Foi lá que você começou o Kibe Loco, né? 
A ideia deles era criar uma equipe de marketing jovem pra renovar a linguagem dos produtos do banco – capitalização, seguro etc. Só que não funcionou. A galera era legal, mas é aquela coisa: você faz um trabalho pra renovar a linguagem, vem alguém que manda mais e não quer mudança nenhuma. 
O negócio começou a ficar maçante. Eu todo dia de terno e gravata, logo cedo, no centro da cidade... eu tava morrendo. Então inventei o Kibe Loco. Fazia as fotomontagens zoando o time de um, o time de outro. Comecei por e-mail, depois fiz o blog e mandei pra sete caras, que replicaram entre conhecidos. Um dia, um deles me falou que a tia dele adorava o site. Estranhei: “Mas você mandou pra tua tia?”. Ele: “Não, ela viu sozinha”. Só que ela era professora no Espírito Santo. Pensei: fodeu. Achei uma ferramenta de monitoramento de audiência e descobri que o Kibe Loco tinha 12 mil acessos por dia. Passei a me dedicar mais, fingi até que existia uma equipe. Os textos diziam sempre “nós do Kibe Loco”.

E você continuou no banco? 
Não, acabei saindo do banco e fui pra outra agência, que me permitia continuar tocando o site. Foi ótimo, aprendi coisa, fiz amigos, mas era mercadão de publicidade. E eu não tenho paciência com publicidade.

Por quê? 
É frustração, é gente com ego do tamanho do mundo. Eu estudei pra ser publicitário, pra estar numa agência branquinha, bonitinha, com pufes coloridos e Macintoshs e prêmios em Cannes. Eu queria isso! Mas depois que passei por rádio, agência e caí num departamento de marketing... puta que pariu, que merda.

Se você tivesse virado um super-redator de agência, indo pra Cannes e tal, acha que estaria feliz? 
Eu ia odiar! O-di-ar. Na faculdade meu sonho era esse, mas eu não conhecia, eu tava vendo de longe. Tem uma piada ótima: sabe por que publicitário não tem campainha em casa? Pro cara chegar e bater palma! É exatamente isso. O tempo todo, um querendo mais que o outro, um lambendo a caceta do outro, ou a própria caceta... não dá, puta saco.

Você tem amigos publicitários? 
Vários, e falo o tempo todo disso com eles. Eles mesmos se sacaneiam também. Enfim, a minha carreira estava sendo um fracasso. Mas o legal é que desse fracasso eu consegui quase sem querer inventar o que me tirou de lá. Acabei largando tudo pra viver só do Kibe Loco.

Mas já dava dinheiro? E dá dinheiro hoje? 
Eu tinha recebido umas propostas de ir pra portal, tipo UOLiGBRTurbo. Em 2005 as propostas para hospedar o site eram na faixa de R$ 3.500 por mês. Dava pra eu viver. Depois passei a ganhar mais, é minha fonte de renda até hoje. Ganho para estar hospedado e com publicidade. Nada que vá me deixar milionário, mas permite manter um padrão de vida.

Kibe ainda vive muito do que as pessoas mandam? Tem uma parte autoral, mas o forte ainda vem dos leitores. Se abrir meu Google você não vai acreditar, tenho tipo 70 mil e-mails não lidos. Um dia o Gregório [Duvivier] viu minha caixa postal e falou: “Brother, achei que a minha vida era um inferno! A sua é muito pior”.

“No banco, era todo dia de gravata, logo cedo, no centro. Eu tava morrendo. Então inventei o Kibe Loco

Kibe Loco já foi acusado de se apropriar de conteúdos alheios. “Kibar” virou sinônimo de copiar. 
Isso é coisa de hater da internet. O cara fala mal porque ele queria ser você. A internet projetou muita gente que é editor de si mesmo. Você faz um Twitter, um blog e aí rola uma egotrip louca. O Twitter foi letal. A pessoa ganha 5 mil seguidores e acha que realmente está com um microfone falando para 5 mil pessoas. E não é nada disso. Sobre autoria, é assim: o cara põe um vídeo no YouTube; outro vê e joga num blog. E aí? Ninguém mais pode publicar? Você acha que porque publicou o vídeo de alguém ele é seu? Ah, vai tomar no cu, né?

Mas você responde, entra na briga? 
Não, porque é tudo o que esses caras querem. Se cem caras estão falando mal de mim na internet, quantos estão falando bem? Sério, eu não dou atenção. O Twitter é a caixa de gordura da humanidade, o chorume. Ainda bem que está perdendo força. Você vê na audiência, está caindo vertiginosamente.

Você também faz consultoria de internet pra empresas. Como é isso? 
Há uns seis, sete anos começaram a aparecer muitas agências de marketing digital, viral, essas coisas. Só que é um mercado muito mais oportunista do que especialista. O que acontecia: uma empresa contratava uma agência de publicidade padrão, essa agência contratava uma agência de mídia digital e essa mídia me ligava. Pra pôr conteúdo no Kibe Loco, ou querendo dica pra fazer uma nova “Dança do quadrado”, ou saber se tal coisa tinha cara de viral...

Jorge Bispo

Antonio Tabet

Antonio Tabet

E é possível saber que determinada coisa vai pegar? 
Não dá pra prever 100%, mas tem artimanhas que podem alavancar um conteúdo. Negociar com uma fanpage gigantesca pra que publiquem teu vídeo, negociar com um tuiteiro ou outro, um blog ou outro, isso dá um gás. Mas se ele vai virar um “Para nossa alegria” você não consegue prever. O que dá pra falar é “com isso aqui você bate a tua meta” – tipo chegar em 100 mil acessos, que o cliente já vai amar. Isso não é tão complicado.

E dá pra prever o que não vai dar certo de jeito nenhum? 
Dá, e normalmente você vê culpa do profissional de marketing na parada: o cara que, não satisfeito em ter a caneca com a marca dele aparecendo no vídeo, quer que o cara fale [pega uma caneca na mesa]: “Nossa, mas que vontade de tomar essa Duff”. Não é natural! As pessoas veem isso na TV, na internet elas não querem. Querem autenticidade.

O que era trash, pauta de sites como o seu, hoje é notícia normal de grandes veículos. Como você vê isso?
É uma coisa curiosa. Se você pegar os veículos tradicionais da internet brasileira hoje, UOLiGR7Globo.com, você vai ver que metade do que está lá na home é lixo. “Mulher Melancia canta no chuveiro. Veja o vídeo.” Isso é conteúdo pro Kibe Loco! Mas tá lá no portal. Acho que o Kibe Loco, por ter conseguido audiência com coisas trash, foi muito responsável por isso. Não sei se me orgulho ou me envergonho disso [risos].

Ter notícias bizarras virou estratégia para ganhar audiência
Sim, eles estão atrás de números, como todo mundo. Mas no meu caso não foi estratégia. Não comecei pensando “agora vou fazer um negócio que vai pautar todo mundo”. Foi válvula de escape, eu tava num trabalho chato pra caralho e precisava desopilar. Se existisse YouTube naquela época talvez eu não tivesse feito nada: quando estivesse entediado, botaria o fone de ouvido e ficaria vendo bobagem. Fiz o Kibe Loco porque não tinha muito o que fazer. Eu amava as colunas do Tutty Vasquez, do Verissimo, do Millôr. Eu podia brincar de ser esses caras.

Como você foi parar na Globo? 
Um amigo meu conhecia o Luciano Huck. Eu tinha a ideia de lançar um candidato fictício nas eleições do Rio, então pedi pra ele perguntar se o Luciano não apoiaria. Ele nos colocou em contato e o Luciano me falou: “Esquece essa história de candidato e vem trabalhar comigo”. Fiquei em dúvida. A imagem que eu tinha dele era a de um mauricinho paulista, influente, que conhece umas gostosas. Mas conversei com ele e foi surpreendente. Encontrei um cara inteligente, esperto, generoso. Ele não é meu brother, de tomar chope, mas é um cara que se eu ligo tá disponível, dá ótimos conselhos. Vai ser sempre um parceiro.

No Caldeirão do Huck você era redator?
Sim, mas redator no Caldeirão não era só entregar o texto. Você escreve, viaja pra acompanhar a gravação, volta pra ilha de edição, é muita coisa. Depois de uns três anos e pouco tive vontade de mudar de ares. O Bruno Mazzeo me chamou pra fazer o Junto e misturado, mas não fui liberado; depois me chamaram pra fazer um quadro do Fantástico e não me liberaram de novo. Um dia falei: quero fazer outras coisas. Fiz uma oficina de humor, na Globo mesmo, criando uma série que nunca foi ao ar. Depois apareceu a hipótese de uma série do Kibe Loco, também não rolou. Acabei saindo em janeiro de 2012, depois de seis anos. E em fevereiro já conversei com o Ian [SBF, hoje sócio e diretor dos vídeos do Porta dos Fundos] pra fazermos coisas juntos.

Vocês dois se conheciam da Globo? Como essa turma se juntou? 
Eu e o Ian, a gente trocava umas ideias pela internet, um conhecia o trabalho do outro e sempre falava “vamos conversar”. Um dia a gente se reencontrou e combinou de fazer o CSI Nova Iguaçu. O [Fabio] Porchat já era sócio do Ian numa produtora, contamos pra ele que a ideia era fazer um projeto assim ou assado e ele falou: “Tô dentro”. Foi a mesma coisa com o Gregório [Duvivier]. O último foi o João [Vicente de Castro], que eu conhecia de passagem. Quando eu tava saindo do Caldeirão ele tava entrando. Ele veio pra ser o cara dos contatos. É afilhado do Caetano, estava casado com a Cleo Pires, poderia conseguir participações especiais. E assim a gente se juntou.

“mostramos primeiro pra Fox, pra Sony. Então botamos na internet. E agora não queremos outra coisa”

Vocês tinham uma ideia de negócio, de como isso ia se bancar? 
Não. A gente só sabia que ia ser bom. Só de falar das ideias soltas a gente ria de se esborrachar. Então, mesmo que ninguém gostasse, a gente ia se divertir pra caralho. Na pior das hipóteses, a gente tinha o Kibe Loco. A gente calculava: se a gente coloca um vídeo por semana no Kibe Loco e ele dá um tanto de views, a gente ganha tanto de Adsense no YouTube [o serviço de publicidade do Google gera lucro baseado na quantidade de cliques ou visualizações]. Como a equipe era mínima, nas nossas contas ainda sobraria grana. Claro, todo mundo tinha seu ganha-pão em outras coisas. Mas logo as expectativas foram superadas. No nosso primeiro vídeo, um programa de 15 minutos, a gente achava que se tivesse 70 mil acessos seria um sucesso. Teve muito mais que isso [hoje, só esse primeiro programa contabiliza quase 3 milhões de views].

Não tem nenhum investidor de fora? 
Existe um boato de que o Luciano Huck é dono do canal. O Luciano nunca botou um real no Porta dos Fundos. Nem ele nem ninguém. Só a gente botou, cara.

Vocês tentaram vender o projeto para a TV? 
Mostramos o primeiro pra Fox, pra Sony. O cara da Sony falou que não tinha grana... E a Fox tinha acabado de fechar com o Rafinha [Bastos]. Então botamos na internet. E agora não queremos outra coisa.

Tem muita emissora atrás de vocês? 
Muita. O tempo todo. O louco é que a gente estava num grande veículo, e estava todo mundo meio parado. A gente teve que sair de lá, inventar outra coisa pro veículo vir dizer: “Nossa, vocês existiam!”.

A Globo? 
É, a Globo nos procurou. E também a Rede TV, e canais por assinatura. Só que a gente tá bem. A gente não fecha porta pra TV, mas só iria se não atrapalhasse o que tá acontecendo. Censurando não dá.

Como você se sente com a celebridade súbita? Seu rosto agora é conhecido. 
É muito louco. É insano. No mês passado eu estava no Lollapalooza e me senti a Xuxa. Nego gritava: “Bola azul!”; “Mario Alberto, eu quero foder!”. É estranho, você entra num restaurante e o cara ao lado sabe quem é você. Eu já era feliz de ter conseguido, com o Kibe Loco, criar um negócio a partir do nada, uma oportunidade de fazer algum dinheiro e conhecer gente. Mas o reconhecimento do Porta dos Fundos é diferente, é muito bom. Me envaidece sim. E entre os humoristas vocês também viraram “os caras”, né? Acho que é porque a gente tá fazendo o que todo mundo queria fazer. Todos estávamos trabalhando na TV, que encanta, mas que também pode virar um exercício de frustração. Eu saí da publicidade porque entendi que tudo o que eu criava em algum momento ia passar pelo crivo de gente que não sabia o que tava falando. O cara que diz sim ou não às vezes é o filho do dono da empresa. Então não é impossível você ouvir: “Ah, meu sobrinho não gostou desse vermelho, vamos trocar por azul?”. Saí da publicidade muito por causa disso. Na TV, gostava da adrenalina e tal, mas também me senti tolhido.

Antes do Porta dos Fundos, já tinha experimentado ser ator? 
Fiz curso de teatro, mas era mais pra pegar as gatinhas. Curioso é que estão me elogiando, acredita?

Quando você se assiste, acha bom? 
Eu acho que não comprometo não! E boa parte do que eu faço no Porta são roteiros que eu escrevi. Então sei exatamente o tom, é mais fácil. Pô, estou sendo chamado para fazer séries agora, acredita? Fiz uma participação em Adorável psicose, do Multishow, e me chamaram para uma da Globo, uma da Fox e uma do GNT. Posso trabalhar como ator, mas não penso nisso. Gosto de escrever e atuar no Porta dos Fundos porque é divertido. Mas, se alguém convida, significa que o que faço como ator não é uma merda! Imagina se me chamam pra uma novela da Globo? Ia ser muito engraçado.

Arquivo Pessoal

 de Super-Homem, em foto para o jornal da faculdade (1998)

De Super-Homem, em foto para o jornal da faculdade (1998)

Você vê? 
Quase nada. Futebol, UFC, que adoro. Aqui no escritório a televisão fica o dia inteiro no Discovery Channel ou no Animal Planet, porque o nosso roteirista adora. O roteiro do Quem manda, pensei vendo essa porra. Vi o macaco e pensei: “Como esse filho da puta tem a bola azul?”. E tem umas guerras, o que tem a bola mais azul manda, só ele come as fêmeas... Aí pensei na situação do pai e da garota.

Você gosta de política? Como se definiria nesse campo? 
Humor é oposição, né? Os petistas me odeiam, acham que sou tucano. Não sou. Não tenho inclinação política, só odeio ladrão, filho da puta. Nas últimas eleições [para prefeito] eu votei no [Marcelo] Freixo, e continuo do lado dele.

E nas eleições pra presidente, o que você fez? 
Votei na Marina Silva. No segundo turno, não lembro. Devo ter votado no Serra ou anulado. O Lula não dá, essa história do mensalão foi foda.

O que você acha da discussão sobre politicamente correto e humor? 
Eu acho ótimo o politicamente correto, é importante um controle. Na minha juventude cansei de ver garotos fazendo piadas com o único negro da sala e acho ótimo que não façam mais ou se sintam constrangidos em fazer. É uma evolução natural das coisas.

Mas aí toda piada vira um debate. Não é chato? 
O problema não é o politicamente correto, mas a patrulha. Essa indústria do pointing finger, o cara que fica “isso é racismo!”, por qualquer razão. Os xiitas, de todos os lados, são muito piores do que os caras que supostamente disseminam preconceito. Quem vê preconceito em tudo, até onde não há, dissemina ódio. Acende o fósforo e joga no palheiro.

Coisas como A casa dos autistas (esquete do Comédia MTV) ou a piada com Auschwitz, feita por Danilo Gentilli, deveriam ter sido evitadas? Humorista deve ter freios? 
Nesses casos, e na polêmica com o Rafinha [afastado do CQC depois de uma piada com Wanessa Camargo], os três têm direito de fazer o que quiserem. E a Wanessa tem direito de processar, a associação dos autistas idem, a comunidade judaica idem. Mas tenho pra mim que quando a coisa é bem-feita, quando é engraçado, até a parte atingida releva. Então a discussão é outra: essas piadas eram engraçadas? Casa dos autistas foi uma coisa maravilhosa? Não foi, eles mesmos falam. O que vai salvar o humor da polêmica é ele ser engraçado, ser bom. Se for ofensivo, pode até ter alguém que ria, mas muita gente não vai rir. E o que a gente busca é isto: quanto mais gente rindo junto, melhor.


Ernesto Varela, o repórter

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Ernesto Varela, o repórter fictício que perguntava aquilo que todos gostariam de saber, mas ninguém tinha coragem de perguntar, completa 30 anos e ganha um DVD com a sua história. Reunimos seus criadores, Marcelo Tas e Fernando Meirelles, para relembrar os bons tempos

Era o dia 3 de setembro de 1984, aniversário do então deputado federal Paulo Maluf. O líder do PDS, partido sucessor da Arena, de apoio ao regime militar, dava uma entrevista à imprensa em um hotel em Brasília quando surge um repórter atrapalhado, de óculos de aros vermelhos, com um bolo de chantili na mão. Ele puxa um coro de “Parabéns pra você”, provocando constrangimento geral. Em seguida, pergunta aquilo que todos gostariam de saber, mas ninguém tinha coragem de perguntar: “Deputado, muitas pessoas não gostam do senhor, dizem que o senhor é corrupto, ladrão. É verdade isso, deputado?”. Maluf olha, dá as costas e sai andando, sem responder a questão. A coletiva acaba.

A cena é um clássico de Ernesto Varela, o intrépido repórter criado pelo jornalista Marcelo Tas e pelo cineasta Fernando Meirelles, que encarnava o câmera Valdeci, seu parceiro de aventuras. Varela, o “repórter de mentira que entrevista personalidades de verdade”, estreou em um programa da TV Gazeta em 1983 e depois teve encarnações em outros canais, como SBT, Record, MTV e Globo. Em 2013, completa 30 anos de vida e, para comemorar, será lançado um DVD até o final do ano com registros preciosos de sua história, incluindo cenas da campanha pelas eleições diretas no Brasil, entrevista com o então líder sindical Luiz Inácio Lula da Silva e gravações em Cuba e na União Soviética. Para encerrar a carreira do repórter, Tas prepara com o cineasta e colunista da Trip Henrique Goldman a série “Varela volta ao mundo”. “Será gravada em cinco continentes para sair em 2015”, adianta. Outro documentário sobre a produtora Olhar Eletrônico, que criou o personagem, está sendo feito pelo diretor Kiko Mollica, do Canal Brasil.

“Os militares esperaram a gente desligar a câmera, nos levaram para uma sala e falaram: ‘podem apagar tudo, seus moleques’. O Fernando fingiu que apagava, mas, na verdade, gravou a cara deles e a gente botou no ar”

Trip reuniu Tas, 53 anos, e Meirelles, 57, em um estúdio da produtora O2, em São Paulo, para falar sobre esse personagem que soube unir humor e política como ninguém. “Hoje é normal ter um repórter engraçadinho em Brasília. Vemos no Pânico ou no CQC. Mas na época da ditadura ninguém fazia isso”, diz Meirelles. No encontro, os dois criticaram a chatice e o excesso de regulamentação que imperam hoje no Brasil e que, em casos extremos, tolhem a liberdade de expressão. “Sou muito mais processado hoje do que no regime militar, e por razões muito mais ridículas. Nesse sentido, o Brasil andou pra trás”, afirma Tas. Naquele dia, ele acabava de chegar de uma audiência judicial com um mágico que se sentiu insultado pelo programa apresentado pelo humorista na Band.

Como nasceu o Ernesto Varela?
Tas: A gente tinha essa produtora chamada Olhar Eletrônico. Éramos ruins em tudo, mas pior ainda na frente da câmera. Um dia eu estava em Santos com o Toniko Melo, outro integrante do grupo, e fiz uma reportagem tirando um sarro, num tom de voz que não era o meu. Peguei emprestados uns óculos vermelhos do operador de VT e coloquei. Estava uma temperatura surreal, e eu falei sobre uma estranha variação climática na cidade. Chegamos a São Paulo e o Toniko criou uma vinheta de “Santos urgente”, como se fosse uma notícia de última hora. A gente botou no ar e o pessoal riu. O Fernando olhou e disse: “Porra, e se a gente levar esse cara para outras pautas malucas como essa?”.

De onde veio o nome?
Meirelles: Ernesto veio do repórter Ernesto Paglia. Ele foi o primeiro cara que entrevistou a gente e é meu amigão até hoje. Já Varela era um médico, amigo do meu pai. Doutor Varela era o máximo da sobriedade, um senhor de bigode que andava sempre bem-vestido.
Tas: Nossa intenção era dar um nome antigo, que desse uma credibilidade ao repórter fictício. Deu certo. Nos eventos oficiais, meu crachá vinha sempre com o nome de Ernesto Varela e não de Marcelo Tas.

O fato de o Varela ser um repórter de mentira ajudou a fazer as perguntas mais cabeludas, como aquela famosa ao Maluf sobre se ele é ladrão?
Tas: Sempre. O humor dá uma licença muito importante. Quando você joga com o humor, amplia as possibilidades e deixa as pessoas mais despidas. As perguntas do Varela pareciam sem pé nem cabeça, mas eram difíceis de responder.

Arquivo Pessoal

Tas com Meirelles na União Soviética em 1985

Tas com Meirelles na União Soviética em 1985

Como foi o episódio em que vocês foram detidos em Brasília?
Tas: Nós não tínhamos eleições diretas no país e naquele dia poderíamos ter de volta o direito ao voto. Era o dia da votação da emenda de Dante de Oliveira, em 1984. Brasília estava um tumulto. O general Newton Cruz havia fechado as entradas da cidade. A gente saiu do avião e começou a gravar na pista do aeroporto. Passamos por uma fileira de militares e eu improvisei. Falei: “O tempo aqui em Brasília está muito bom, a temperatura está muito agradável”. Os caras esperaram a gente desligar a câmera, nos levaram para uma sala e falaram: “Podem apagar tudo, seus moleques”. O Fernando fingiu que apagava, mas, na verdade, gravou a cara deles. Depois a gente editou o material e colocou tudo no ar.
Meirelles: Teve outro episódio engraçado, quando a gente entrou numa garagem e encontrou o José Sarney. O Varela o entrevistou e, no final da matéria, eu perguntei: “Quem é esse cara, Marcelo?”. Ele respondeu: “É um alagoano, acho. Roney, Andrey, algo assim” [risos]. Ele fugiu de todas as perguntas.
Tas: Olha a sabedoria do Sarney. Ele apoiava a ditadura, mas percebeu que o barco podia mudar de direção. Ele mudou junto e acabou virando presidente da República. Ele está sempre do lado de quem está no poder e é capaz de iludir até as pessoas mais inteligentes. O Sarney arrasou o Maranhão durante 60 anos, deixou a população em um estado miserável e para quê? Para ter um iate, uma ilha? E ainda vem com esse verniz de escritor intelectual.

Como foi o comício no Pacaembu em que vocês entrevistaram o Lula?
Tas: Foi o nosso primeiro furo de reportagem.
Meirelles: Tem furo ali?
Tas: Você não sabia?
Meirelles: Não. Eu lembro que aparece a Marta [Suplicy] reclamando do [Eduardo] Suplicy, mas isso todo mundo já sabia, né? Ela fala que o então marido tinha mania de política, que a política competia com ela.
Tas: Ela dizia que não sabia qual era o prazer da política. Hoje em dia tem orgasmos com a política [risos]! Eu comecei a recuperar essas imagens e descobri que são as únicas desse comício, o primeiro da campanha pelas diretas no Brasil. Temos um documento histórico, Fernando. Além do Lula, também tem o José Genoino, o Hélio Bicudo e vários líderes estudantis da época.

Vocês têm gravado o episódio em que o Varela vai atrás do empresário José Victor Oliva no banheiro da boate Gallery, em São Paulo, e pergunta como são os ricos na intimidade?
Tas: Esse episódio infelizmente eu não consegui encontrar.
Meirelles Aconteceu uma coisa tristíssima. Quando a gente tinha bastante material e achava que aquilo tinha valor, decidimos gravar numas fitas melhores. Um dos nossos sócios trabalhava na Globo e falou: “Eu posso fazer à noite lá, na surdina”. Ele pegou duas caixas com tudo o que tinha do Varela, pôs no carro, parou numa padaria e roubaram o carro dele! Com isso, perdemos um ano e meio de histórias.

“Na época do Varela, a gente chutava canela sem medo.Era possível ser contudente e não tinha advogado ligando no dia seguinte. Hoje é mais cerceado. Se tivéssemos que pagar todos os direitos autorais, não teríamos feito nada”

Vocês sofreram processos na Justiça por causa do Varela?
Tas: É curioso isso. Fui pouco processado como Varela e hoje eu sou muito mais por causa do CQC. Os processos hoje são por razões muito mais ridículas. Nesse sentido, o Brasil andou pra trás nos últimos 30 anos.
Meirelles: Não é o Brasil, é o mundo. A minha teoria é que a indústria dos advogados está fazendo tudo ficar chato. Não é possível fazer mais nada! Eles têm uma profissão chata e, não contentes em ter uma vida chata, querem que a vida de todo mundo seja chata também.
Tas: Nos Estados Unidos, essa febre de processos já passou. No Brasil, como a Justiça não funcionava, ninguém processava ninguém. Agora a Justiça ameaçou funcionar e as pessoas começaram a processar. Elas pensam: “De repente ganho uma grana com isso”.

Quantos processos você tem nas costas?
Tas: Vários, mas menos do que quando começou o programa. É um jogo, um Banco Imobiliário do Judiciário. Quase todos os candidatos processam o CQC. Por quê? Para evitar que na campanha eleitoral a gente faça uma perguntinha mais pontiaguda para ele. Isso ocorreu muito na eleição de 2008. Na de 2010 diminuiu e na de 2012, se não me engano, não houve nenhum.

Já perderam processos na Justiça?
Tas: O CQC nunca foi condenado. Pelo contrário, ganhamos vários.

“Somos todos seres humanos precários, fingindo não ser mais macacos. O humor é quando você ri dessa precariedade. Temos que estar abertos para isso”

É mais difícil fazer humor hoje?
Meirelles: É, porque você faz uma piadinha com o mágico e vai parar no tribunal por causa disso. Na época do Varela, a gente chutava a canela sem medo. Éramos sempre respeitosos, nunca xingamos ninguém, mas era possível ser contundente e não tinha nenhum advogado ligando no dia seguinte. Hoje é tudo mais cerceado. Se tivesse que pagar todos os direitos autorais, a gente não teria feito nada. Nós pegávamos um filme do Batman, copiávamos e colocávamos no ar. Não tinha que falar nada com ninguém. Ou eu filmava o cara na rua e pronto. Não tinha que levar papelzinho com autorização para assinar.
Tas: Éramos fora da lei. Para publicar esse DVD do Varela eu estou sofrendo. A gente pegava um disco dos Rolling Stones e botava na trilha. Agora tenho que ver quantos segundos tem, se aquilo está caracterizado como uma exploração do fonograma X. Cada caso será analisado e, nos mais radicais, vamos ter que criar uma trilha nova e reinserir.

O que mudou e o que continua igual na política brasileira nos últimos 30 anos?
Meirelles: Não tenho dúvida de que hoje há mais liberdade e democracia. Mas a gente sedimentou essa coisa da troca de favor, do político de aluguel. Isso sempre existiu, mas era disfarçado.
Tas: Na época da ditadura, a gente tinha uma identificação com a esquerda porque era quem estava lutando contra o regime militar. A minha decepção é que hoje essa esquerda continua vivendo naquela época, em que ou você é amigo ou é inimigo. E o mundo não é mais assim. Muitas pessoas olham o CQC com preconceito. O cara não admite que a gente possa criticar o Lula. Se você discorda dele, recebe um carimbo de que é tucano. Eu acredito que podemos ter uma interlocução com todas as forças da sociedade. Essa é a falha trágica do momento atual. A pessoa não quer conviver com quem ela discorda. Se é evangélico, não quer conviver com os gays. E vice-versa. Assim como os gays criticam o Marco Feliciano [presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias na Câmara], os gays têm preconceito em relação aos evangélicos. Acham que todo pastor é pilantra e todo evangélico é boboca. E não é. A gente tem que perceber que todos nós somos seres humanos precários, fingindo que não somos mais macacos. O humor é o momento em que você ri dessa precariedade. E nós temos que estar abertos para isso: rir dos outros e de nós mesmos.

Rafael Cortez

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Divulgação

Rafael Cortez

Rafael Cortez

Rafael Cortez é músico, jornalista, ator, humorista e atualmente apresenta o programa de televisão Got Talent Brasil, na Rede Record. Paulistano, ele se formou em jornalismo pela PUC e, antes de garimpar talentos na televisão, trabalhou como organizador de festa infantil, ator de teatro, produtor de circo, assessor parlamentar e redator de notícias para celular. A carreira televisiva começou em 2008, no programa CQC, da Band, onde ele foi repórter durante cinco anos.

O papo desta semana no Trip FM é com esse multi-homem que, em paralelo ao trabalho na televisão, apresenta aindo o show de humor “De Tudo um Pouco” e se dedica (e muito) a uma carreira musical: o cara é um violonista clássico de mão cheia e lançou em 2011 o disco instrumental Elegia da Alma.

O Trip FM vai ao ar na grande São Paulo às sextas às 20h, com reprise às terças às 23h pela Rádio Eldorado Brasil 3000, 107,3MHz

Descaminhos

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Reprodução

Editora digital Descaminhos

Editora digital Descaminhos

A escritora Patrícia Galvão (1910-1962), a Pagu, já foi personagem de minissérie da Globo e “mais macho que muito homem” numa música-homenagem de Rita Lee e Zélia Duncan. Musa dos modernistas brasileiros, casou-se com Oswald de Andrade, que deu um pé na bunda da pintora Tarsila do Amaral por ela. Ao lado do poeta, lançou em 1931 o pasquim político O Homem do Povo. Quando o jornal definiu a Faculdade de Direito da USP como um dos dois “cancros de São Paulo” (ao lado do café), e alguns estudantes depredaram a sede na praça da Sé, ela revidou com unhadas e até tiros de revólver, segundo o noticiário da época. Irreverente, foi presa mais de 20 vezes ao longo da vida, por motivações políticas.

Pagu é, enfim, o que a agente literária Leda Cintra define como “midiática”. É também símbolo de uma indústria cada vez mais empoeirada. “Ela sempre chama atenção da mídia, mas não vende. Ou vende pouquíssimo”, lamenta. Segundo Leda, 3.000 exemplares de um livro da escritora (média da tiragem inicial no Brasil) “só com muita dificuldade esgotam”. A título de comparação: O Código da Vinci, de Dan Brown, vendeu 1,8 milhão de cópias no mercado nacional.

Se a coisa está feia para Pagu, imagina para tantos outros autores brasileiros bem menos pop. Dois amigos, Leda e o historiador André Caramuru, foram além de imaginar: resolveram fazer algo a respeito. Daí nasceu a editora digital Descaminhos, que será lançada nesta terça-feira (28), na Livraria da Vila, em São Paulo.

O projeto estreia na Amazon, gigante das publicações on-line, com a obra completa de autores prestigiados, mas desaparecidos das prateleiras. Entre eles, a própria Pagu, seu último marido, o escritor Geraldo Ferraz (190-1979), e o dramaturgo Jorge Andrade (1922-1984) – que terá comercializados, além de textos inéditos, trabalhos feitos para a revista Realidade e crônicas publicadas na Folha de S.Paulo. Escritores contemporâneos também entrarão no catálogo da Descaminhos.

“A gente não está preocupado com vendagens, e sim em deixar os livros à disposição do leitor. Pode vender três, quatro cópias por ano. Ao menos está lá. Há títulos de Pagu e de Jorge Andrade que você não encontra mais”, afirma Caramuru, que é colunista da Trip e que também terá obras suas à venda na editora.

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Patrícia Galvão, a escritora Pagu

Patrícia Galvão, a escritora Pagu

Leda o representava no mercado editorial “e vinha sofrendo muito para que nós, autores representados por ela, furássemos a barreira”, diz. Isso porque Caramuru era um “novato”. A agente literária lembra que muitos bambas penam com o ostracismo. O paulista Raduan Nassar, de Lavoura Arcaica (1975) e Um Copo de Cólera (1978), é presença frequente na lista dos melhores autores brasileiros do século XX. “Mas desistiu da literatura quando viu uma pilha de livros dele tomando chuva num sebo”, diz a amiga Leda. Recluso, o escritor de 77 anos vive hoje num sítio em Pindorama (SP), sua cidade natal. Seu último conto inédito foi publicado em 1997, na coletânea Menina a Caminho.

Matemática

O problema do mercado literário, para Caramuru, é que a conta não fecha. Exemplo: ele estava atrás do livro Past Imperfect – French Intellectuals, 1944-1956, do colega inglês Tony Judt (1948-2010). Acabou topando com um passado imperfeito à parte: para comprar a cópia de capa dura do título, lançado em 1992, precisaria desembolsar US$ 44. Com a mesma quantia, daria para adquirir quatro versões digitais da mesma obra, a US$ 10 cada – e ainda sobrava troco para um ou dois chopinhos.

Caramuru entusiasma-se fácil ao falar da novas tecnologias aplicadas à literatura. Se deixar, dá um relatório completo das vantagens do e-book, o livro adaptado para tablets. Ao mesmo tempo, o ontem lhe interessa e muito, como os vários autores fora de catálogo e de moda.

Há vários argumentos contra e a favor das literaturas digital e em papel. Livro não dá pane elétrica, não cansa a vista e fica bonito na prateleira ou embaixo do sovaco, dizem aqueles que ainda não querem virar a página da leitura impressa. Dá para carregar centenas de e-books num tablet de 240 gramas, e os preços são bem mais em conta, rebatem os defensores da digitalização.

O lance é que, para as editoras, imprimir obras físicas é sempre um risco. “Custa muito dinheiro. Por isso, estão cada vez mais apostando em títulos certos”, afirma Caramuru. “A gente nunca entende quando um autor venderá, nem os editores entendem, e é por isso eles têm tanto medo”, completa Leda. O fenômeno se repete em outros segmentos da indústria cultural. Não à toa os estúdios de Hollywood preferem torrar milhões em sequências do Homem de Ferro, uma aposta relativamente segura de retorno financeiro, do que garimpar entre novos cineastas.

A Descaminhos, segundo seus sócios, seria uma trilha alternativa para um autor ser publicado, a custos bem mais baixos – um e-book será vendido por R$ 9,99 num primeiro momento. Ao autor serão repassados 50% desse valor, enquanto as grandes editoras costumam remunerá-los com 10% do preço da obra (uma fatia que muitas vezes ainda precisa ser dividida com o ilustrador).

Se o e-book está no descaminho certo? Leda lembra de uma máxima de Esdras de Nascimento, piauiense de 79 anos e um dos escritores publicados pela editora digital: “Não teremos mais ácaro, poeira e fungos”. Pergunte ao pó.

Vai láwww.facebook.com/Editora-Descaminhos

Marcelo D2

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divulgação

Marcelo D2

Marcelo D2

Ele é um dos principais nomes do hip-hop nacional e um pioneiro da discussão sobre a regulamentação da maconha no Brasil. Carioca, sua trajetória na música começa no grupo Planet Hemp, com quem lançou em 95 o disco de estreia da banda, o Usuário. Três anos depois, em 98, ele lançou seu primeiro disco solo, o Eu Tiro é Onda, disco que evidenciou uma característica marcante do seu trabalho, a maestria com que ele mistura ao rap sonoridades tipicamente brasileiras, como o samba.

"A música é uma conversa e é muito bom conversar com todos. Gente mais nova, mais velha, de diferentes estilos...O que mais me fascina na música é isso, misturar ritmos"

O papo desta semana é com o Marcelo Maldonado Gomes Peixoto, mais conhecido como Marcelo D2, que está lançando seu quinto álbum solo, o Nada Pode Me Parar.

O Trip FM vai ao ar na grande São Paulo às sextas às 20h, com reprise às terças às 23h pela Rádio Eldorado Brasil 3000, 107,3MHz

Carioca no TripTV #28

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O TRIP TV desta semana traz uma conversa franca com o humorista Carioca, do programa Pânico. Um dos mais talentosos imitadores da atualidade, Carioca revela detalhes sobre seu processo de criação e afirma: "A minha arte é de enganar mesmo e te convencer de que eu sou aquela outra pessoa. Às vezes, até eu acredito que sou".
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Esse vídeo é parte integrante do programa TripTV #28
Veja na íntegra aqui: http://www.youtube.com/watch?v=nIMj4IQ146U
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TRIP TV, o programa semanal da TRIP, vai ao ar pela Mix TV
todos os sábados, às 23h, com reprises às terças, às 23h30, e quintas, às 23h45
Saiba mais: http://revistatrip.uol.com.br/trip-tv

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